quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Capítulos 28 e 29


Fundações: Capítulo 29
Pistas de leitura

Esta narração da fundação de Palência tem uma estrutura bastante clara. Em primeiro lugar, a Santa, já nos seus últimos anos de vida e muito debilitada pela epidemia de bronquite (que quase acaba com ela), fala da sua excessiva fraqueza e de como o Senhor actuou para lhe infundir força e pô-la a caminho (1-6).
Trata em seguida da duríssima viagem em pleno inverno, e da fundação em segredo, conforme o seu costume, apesar de contar com o apoio do bispo e da generosíssima gente de Palência (7-11).

Dedica, depois, a parte mais extensa do capítulo ao episódio mais complicado desta fundação: a compra da casa onde se alojaria definitivamente a comunidade. Nesta parte destacam os muitos e bons colaboradores; no entanto, também não falta as estratégias necessárias para que a compra se faça bem e os vendedores não especulem com as suas necessidades e interesses. Contudo, será uma nova locução do Senhor a que vem esclarecer a questão: resulta muito interessante reparar nas dúvidas que surgem na Santa sobre o assunto e como as esclarece… (12-29).
Finalmente, a narração fecha com a famosa alusão ao Capítulo de Alcalá e a conseguida independência jurídica dos descalços; breve, mas intensa (30-33).


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…

1. A Santa descreve o seu estado de ânimo inicial, como “um dos grandes trabalhos e misérias da vida (…) terrível coisa… em especial se é alma que já se viu com grandes desejos de não descansar interior e exteriormente, empregando-se totalmente no serviço do seu grande Deus” (3). Depois de toda uma vida arrastando grandes enfermidades e quase 20 anos a viajar e a fundar em condições muito difíceis – quer dizer, treinada em “grandes trabalhos” – e, ao mesmo tempo, cumulada de graças místicas, que te sugere este seu estado anímico?

2. “Aqui não há outro remédio senão ter paciência, reconhecer a própria miséria e abandonar-se à vontade de Deus…” (3). Portanto, não tem nada a ver com culpabilizar-se, nem questionar-se voluntariamente… -Tem-lo em conta para ti próprio e para aqueles a quem possas aconselhar? – Revê, agradece, intercede…

3. Apesar da atitude teologal anterior, sente a falta de “alguém que me animasse” (3). Mas quando os há, também não lhe bastam (cf. 4-5a). Parece, pois, que em discernimento onde houver dados tão evidentes – como o era aqui a sua fraqueza por razões sérias e objectivas de saúde – devem prevalecer estas; salvo se o Senhor falar alto e claro (cf. 6): estás de acordo? Pratica-lo? Como?… Evidentemente, será rara uma locução assim; mas reconhecer “a voz” do Senhor exigirá, sempre, alguns frutos dos que aqui se apontam: “fiquei tão determinada e animada…” (6). - Achas isto coerente? Fácil de levar à prática?

4. A propósito de remédios e de discernimento, não deixes de te deter no seguinte texto: “Estando um dia, depois de comungar, nestas dúvidas e sem me determinar a fazer qualquer das fundações, supliquei a Nosso Senhor que me iluminasse para fazer em tudo a Sua vontade, pois não era tanta a tibieza que chegasse a ponto de diminuir, por pouco que fosse, este desejo” (6).

5. Essa grande debilidade anímica inicial acaba mesmo por obnubilar convicções e experiências tão firmes, no seu caso, como a de que “para fazer mosteiros de pobreza, sem renda, nunca me falta coragem nem confiança” (20,13; cf. 29, 1-2). – Que achas da maneira como a insegurança pessoal afecta as nossas, não só convicções, mas também experiências vitais e religiosas? Obviamente, se isto é assim, é uma boa e necessária matéria para velar e orar… (cf. Lc 22, 40).

6. Evidentemente, a graça com que o Senhor a anima, implica que, embora “me dissessem não ser possível viver de esmolas em Palência, era como se não mo dissessem (…) pois Deus me mandava fazer a fundação, Sua Majestade havia de providenciar (7). E fê-lo tão admiravelmente como era habitual, através de “quem O ajude” (8), que Teresa não se cansa “de louvar a caridade, tanto geral como particular, que encontrei em Palência” (27). Seria bom reparar nas pessoas que destaca e agradece em particular, e confrontar-nos com isso: -Levo contas do bem? Agradeço-o ao Senhor e à pessoa?…
No entanto, queremos agora ressaltar sobretudo como aquela caridade lhe pareceu “coisa da primitiva Igreja” (cf. Actos 2, 44-45): - Que achas de que, numa sociedade tão cristã, seja tão estranho encontrar quem esteja disposto a partilhar de verdade, mesmo do que lhes faz falta para viver (Lc 21, 1-4)? – Como te vês tu e o teu contexto (comunidade, família…) a esse respeito? (Cf. Caminho de Perfeição, cap.2 e a Ficha correspondente). Tal como nesta se destaca, recordar que a Santa não era uma “pauperista radical”: até compraria, mesmo que notoriamente encarecida, “uma casa que parecia convir para mosteiro” (22).

7. Que achas de que, apesar de tanta ajuda do Senhor e das pessoas, a Santa continue com as suas estratégias habituais? Tanto para a sua chegada à cidade – em segredo, porque se não o demónio inquieta, mesmo que “nada consiga” (9) - como para a compra posterior de casa definitiva, para o qual, por exemplo, visita várias “não com intenção de adquiri-las, mas para que o proprietário da outra não pensasse que não tínhamos outro recurso senão a dele” (15).

8. Aparece uma nova fala do Senhor na Comunhão (18, cf.6). Em relação ao Santíssimo Sacramento, já lemos nela coisas importantes (cf. Vida, 22 e 38,21; Caminho 33.35; e as Fichas correspondentes), embora, na realidade, sempre se possa aprofundar mais. Convidamos, no entanto, a reparar agora no discernimento posterior que implica esta nova fala (19-24): questões que relembra, como e com quem a Santa as debate, como é que ela e o seu confessor concordam na mudança de casa que o Senhor propôs… São, sem dúvida, boa matéria para reflexão e oração

9. Se este capítulo começava com “um dos grandes trabalhos e misérias” (3) que Teresa experimentou, termina, no entanto, com “um dos maiores gozos e consolações que poderia receber nesta via” (31). – Aprecias e agradeces o que significa ter um lugar na Igreja e um reconhecimento jurídico que permite encarnar e desenvolver o teu carisma e a tua própria vocação, os teus direitos e obrigações? – Vês, desde este ponto de vista, o Direito Canónico?

10. “Agora começamos, e procurem ir começando sempre, de bem em melhor…” (32). Esta frase tem sido na Ordem todo um lema da necessidade de sermos criativos para sermos fiéis. Mas parece que o seu contexto imediato aponta precisamente para o contrário: “guardem-se, por amor de Deus, de deixar cair algum ponto de perfeição. Não vá dizer-se, por sua causa, o mesmo que de muitas Ordens, das quais só se louvam os princípios (…). Olhem que, por muito pequenas coisas vai o demónio abrindo brechas por onde entram as muito grandes. Que jamais lhes aconteça dizer: isto não tem importância, são exageros.” – Que opinas? Achas que terá a ver alguma coisa com Mt 5, 17-19 e a sua necessária interpretação eclesial nada literal?…

11. O facto do Concílio Vaticano II pedir que renovássemos as nossas Constituições e, com isso, não alguma mas muitas coisas de perfeição, demonstra que a interpretação literal e rigorista destes parágrafos não é fiel ao sentir da Igreja. Portanto, este aparente paradoxo – uma “santa presunção” (33) – que Teresa pede às suas filhas como conclusão, poderia interpretar-se muito bem como fidelidade ao chamamento universal à intimidade com o Senhor 1, a santidade entendida como pertença a Ele, antes do que em sentido moral ou qualquer outro (cf., por exemplo, Novo Millennio Ineunte 30). – É esta “santa presunção” prioritária para mim? – Como potenciá-la?




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1 “Deus nos livre, irmãs, quando fizermos alguma coisa imperfeita, de dizer: não somos anjos, não somos santas. Olhai que, embora não o sejamos, é grande bem pensar que, se nos esforçarmos, o poderemos ser (…). Esta presunção quereria eu nesta casa, porque faz sempre crescer a humildade: ter uma santa ousadia, pois Deus ajuda aos fortes e não faz acepção de pessoas” (Caminho, 16, 8 ou 12, segundo as edições).


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