quarta-feira, 20 de março de 2013

Terceiras Moradas: Segundo capítulo Capítulo II:




Terceiras Moradas: 
Segundo capítulo
Capítulo II: 


Se o primeiro capítulo destas terceiras moradas concluía com a exclamação: Prova-nos, Tu, Senhor, que sabes a verdade, para que nos conheçamos, neste segundo capítulo Teresa de Jesus vai ensinar-nos como prova o Senhor aos que estão nestas moradas (título) para que se conheçam de verdade e não de imaginação.
As pessoas que aqui se encontram ainda não são senhoras das suas paixões: basta um pequeno empurrão, causado pelas contrariedades da vida, para que todo o seu “concerto” caia ao chão. Falta-lhes liberdade de espírito, dirá Teresa; caminham demasiado devagar, cheias de temores e prevenções. E, lembrando-se das suas andanças pelos caminhos de Espanha, pergunta: Parece-vos, filhas, que se indo de uma terra a outra pudéssemos chegar em oito dias, seria bom andar um ano por ventos, neves, chuvas e maus caminhos? Não valeria mais passa-lo de uma vez?
Santa Teresa conhece muito bem por experiência estas 3M (3M 2,7), e por isso avisa aos que vão com tanto senso do perigo que correm: é muito fácil voltar atrás, estamos muito perto das 1M, se não se esquecem das suas concertadas razões e dão o salto confiando unicamente no Senhor. É a prova do amor, humildade e obediência que lhes porão asas nos pés.


Pistas de leitura

1- Enganos de gente aproveitada (3M 2, 1-3)
Não há pior surdo do aquele que não quer ouvir, diz o refrão, e assim são, ao pé da letra, estas pessoas que Teresa chama pessoas concertadas.
Qualquer inquietação, inclusive a secura na oração, fazem dela um drama e “sacralizam-na”, pois é por Deus que as sentem e assim não vêm a entender que é imperfeição. Dar-lhes conselho não remedeia: sabem tudo, há muito que começaram o caminho espiritual e podem ensinar outros. Canonizam em seus pensamentos estas coisas, e assim quereriam que os outros as canonizassem.

2- As “provas dos bons”
Teresa de Jesus põe uns exemplos gráficos para que entendamos de que provas se trata. Afectam ao que há de mais humano e mais terra-a-terra: o dinheiro e a imagem (3M 2, 3-4); são “coisinhas” mais ou menos grandes que a vida traz num ou noutro momento.
É interessante notar que, para Teresa, também na prosperidade há um perigo a evitar: o afã de ganhar mais, licitamente, embora seja para o dar a outros. Uma pessoa que tome seriamente o seu seguimento e queira chegar às moradas onde habita o Rei deve guardar-se da ambição, sob qualquer pretexto, e da falsa segurança que dá o dinheiro. No fundo, trata-se do Evangelho: “não podeis servir a Deus e ao dinheiro”.
Com ironia, dirá Teresa que estas boas pessoas quereriam a todos tão concertados como eles trazem suas vidas, e praza a Deus que não pensem que a pena que têm é pela culpa alheia e a façam meritória em seu pensamento (3M2,5)

3- «O hábito não faz o monge»
Na vida ordinária, vamos ter múltiplas ocasiões de ver se estamos tão atados como os habitantes das 3M. O importante não é levar um hábito, mas procurar exercitar as virtudes e render a nossa vontade à de Deus em tudo (3M 2,6). De novo, o critério é o Evangelho (e não podia ser de outro modo!): que não se faça em nada a nossa vontade mas a Sua.

4- “Não está ainda o amor para pôr de parte a razão”.
Esta é a chave: o amor que prevalece nestas pessoas é o amor a si mesmas e não a Deus. É precisa uma forte sacudida e uma determinada determinação para sair deste estado: Deixemos a nossa razão e temores nas Suas mãos [nas de Deus] … Humildade, que é o unguento de todas as feridas: é a receita de Teresa, pois este caminho faz-se depressa com profunda humildade; aqui, creio, que está o dano das que não passam adiante. A perfeição não está nos gostos, mas em quem ama mais – conclui satisfeita (3M 2,10).

5- As boas companhias.
Boas, sem ironia, porque para avançar para as 4M é muito boa ajuda tratar com quem já está desenganado das coisas do mundo, do que não vale nem enche a alma, e assim aproveita tratar com quem já conhece o mundo para nos conhecermos (3M 2, 12). Anima muito – aconselha Teresa – ver que é possível, vendo-o noutros o que a nós nos parece impossível, e de novo acode ao remédio da obediência – ter a quem recorrer para não fazer em nada a sua vontade, quer dizer, deixar-se discernir para lutar contra a auto-suficiência que nos cega.

6- Alguns conselhos de ouro:
- Guardar-se das ocasiões pois não estão ainda tão fortes que não possam voltar atrás com facilidade.
- Não bisbilhotar vidas alheias nem julgar o próximo com facilidade: Olhemos as nossas faltas e deixemos as alheias (3M 2, 13).
- Não querer que todos vão pelo mesmo caminho.
- Cuidado, porque, sob capa de bem, podemos cometer muitos erros (ibid.).


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…

1. Como reagimos aos contratempos ordinários da nossa vida? Deixamo-nos abater pelas pequenas coisas? Reler 3M 2, 1-7.
2. “Procurar ajuda” De novo, como já tinha feito na Livro da Vida (cf. V 7, 20-22), Teresa lembra-nos a importância do grupo para o cristão – os cinco que, ao presente, nos amamos em Cristo (cf. V 16, 7). Lembra que classificou de “loucos por amor” (V 16,6) aqueles que estão dispostos a arriscar mil vidas por Cristo e se apoiam uns aos outros para consegui-lo (cf. V 34, 16). – Como te sentes no teu grupo, na tua comunidade paroquial? – Ajuda-te a viver com mais entrega? – Como poderias progredir no acolhimento, na aceitação do contraste e o conselho dos outros?
3. Compara e medita: V 20, 26-28 e 3M 2, 4-6-
4. Reconheces-te em alguma das “pessoas concertadas”? Lê novamente 3M 2, 13 e V13.
5. Bendiz a Deus pelas obras que realiza nos outros (2M 2, 11) e louva-O com este belo texto de Vida 16, 4-8.A santa loucura celestial é o verdadeiro antídoto para pessoas concertadas:

E pois que ao escrever isto não estou fora desta loucura celestial – de que tão sem méritos meus e por Vossa bondade e misericórdia me fazeis mercê – eu Vos suplico, meu Rei, que tenhais agora por bem que todos aqueles com quem eu tratar estejam loucos de Vosso amor ou permiti que eu não tenha já em conta coisa que seja do mundo, ou tirai-me dele.
Não pode já, Deus meu, esta Vossa serva sofrer tantos trabalhos como tem por se ver sem Vós e, assim, se há-de viver, não quero descanso nesta vida, nem que Vós lho deis. Quereria já esta alma ver-se livre do corpo: o comer, a mata; o dormir, a atormenta; vê que se lhe passa o tempo da vida vivendo em regalos e que nada já a pode regalar afora Vós. Parece que vive contra a natureza, pois já não quereria viver em si, senão em Vós…

Suplico a V. Mercê que sejamos todos loucos por amor d’Aquele a quem por nós assim chamaram. Diz V. Mercê que me quer bem, pois em dispor-se para que Deus lhe faça esta mercê e quero eu que mo mostre, porque vejo muito poucos que os não veja com senso demasiado para o que lhes diz respeito. Bem pode ser que o tenha eu mais que todos…
Desengane-me com verdade, que se usam muito pouco estas verdades (V 16, 4-5).


Terceiras Moradas: Primeiro capítulo

                                  


Terceiras Moradas: Primeiro capítulo
Quantas figuras bíblicas encontramos nestas moradas! O protagonista do salmo 111, David, Salomão, o apóstolo São Tomé, a Virgem Maria e…o paradigma do habitante das Terceiras Moradas: o jovem rico (Mt 19, 16-22).
O modelo destas 3M não pode ser senão este “mancebo do Evangelho”, porque estas são as moradas dos bons e “muitíssimo bons”, mas - sempre há um “mas”- que não são capazes de ir mais além das suas obrazitas (3M 1,6), que tudo têm pesado, medido, equilibrado, arranjado…concertado, como diria Teresa.

São pessoas estupendas, “que tudo têm cumprido desde a juventude”, de comunhão diária, de grupo paroquial, catequistas e até consagrados, daqueles em quem Jesus Se compraz e olha com carinho. Mas, quando escutam aquilo de “vende o que tens… e depois vem e segue-Me”, voltam as costas com tristeza. “Não, não está ainda o amor para pôr de parte a razão” (3M 2,7).
- Seremos nós por ventura um destes?


Pistas de leitura

1 – Olhai muito, filhas, para algumas coisas que aqui vão apontadas, ainda que atabalhoadas (cf. 3M 1,9). Capítulo 1 das 3M:
§ Teresa felicita-nos: se chegámos a estas formosas moradas somos Bem-aventurados, vencemos os combates e a com a nossa perseverança aqui estamos: “se não volta atrás leva caminho seguro na sua salvação” (3M 1,1). Não é possível um começo melhor, embora em breve nos mostre o exemplo de David e Salomão, e nos avise da falta de segurança em que nos encontramos. Nestas moradas ainda há mais perigo do que nas primeiras, porque aqui já nos julgamos alguém, somos gente dela, nas nossas atitudes, que até parece que nos é devido e não nos pagam” (3M 1-5).
§ As bem-aventuranças teresianas (3M 1,2). Temos aqui uma oração que convém rezar com Teresa.
§ Teresa recorda (3M 1, 3-4). Diz o P. Tomás Álvarez que Teresa de Jesus evoca aqui a sua própria história, a lembrança agridoce da sua passagem pelas 3M por volta dos seus trinta anos, que durou longo tempo e que descreve com dramatismo em V 8, 11-12. É estimulante para nós que, nesta experiência da própria fragilidade, nos acompanhe a experiência de Teresa.
§ Teresa oferece-nos um espelho (3M 1,5-6). Parece que há muitos orantes que chegam a esta morada, mas não tantos que passem adiante… Temos aqui um retrato-robô daqueles que muito desejosos de não ofender a Deus, se guardam de todo o pecado até mesmo venial. Amigos de penitência. Com suas horas de recolhimento. Gastam bem o tempo. Exercitam-se em obras de caridade com os próximos. Muito concertados no falar e no vestir e no governo de casa.
É uma linda disposição, nos dirá Teresa, mas há uma falta de generosidade, como a do jovem rico, um apego excessivo á própria vontade e às próprias ideias. Em resumo: é a adolescência espiritual.
§ Um remédio muito teresiano (3M 1,7): Ó humildade, humildade! O problema é a falta dela; falha o conhecimento próprio. Prove-nos o Senhor, pois bem o sabe fazer! O amor tem de ser provado com obras, assevera Teresa de Jesus: Deus olha à determinação da nossa vontade!
Provai-nos Vós, Senhor, que sabeis as verdades, para que nos conheçamos!

Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…
1. Que te sugeriu o texto? Reconheces-te, de alguma maneira, nestas pessoas descritas?
2. Diz Teresa de Jesus que este é um estado para desejar… Para passar mais adiante talvez tenhamos que deixar Deus, e os outros, romperem os nossos esquemas e seguranças. Medita e partilha Caminho de Perfeição 32,8 neste contexto.
3. Ora com Teresa: - Que podemos fazer por um Deus tão generoso… (3M 1,8)?
4. Embora não seja com a obra, podemos oferecer ao Senhor a vida com a determinação da vontade. Podes orar com a poesia: “Vossa sou, para Vós nasci”. 

quinta-feira, 14 de março de 2013

Segundas Moradas Capítulo único


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Para entrar nas segundas Moradas, Teresa adverte-nos de que teremos de perseverar na luta, e distingue entre as almas que já começaram a ter oração e compreendem quanto importa continuar para a frente, e as que não se dão conta do perigo em que estão, sempre distraídas no exterior, sem ouvirem o chamamento do Senhor.

Pistas de leitura 

Teresa começa por nos dizer “quais serão as almas que entram nas segundas moradas e o que fazem nelas” (2M 1): 
Começaram a ter oração e sabem quanto importa continuar para a frente. 
Compreendem que têm de deixar as ocasiões. 
Ouvem os chamamentos que lhes faz o Senhor através de pessoas boas, livros, sermões, doenças, etc. 

E uma lista dos impedimentos que vamos encontrando: 
- A estima que nos têm no mundo. Os parentes e amigos. 
- A saúde nas coisas de penitência. 


Para continuarmos para as segundas Moradas vão-nos ajudar: 

A razão que nos “representa o engano que é pensar que tudo isto vale alguma coisa em comparação do que pretendemos” (2M 4) 

A fé que nos ensina o que nos cumpre fazer (Ibid.). 

A memória que nos recorda em que vai parar tudo isso (Ibid.). 

A vontade que nos inclina a amar Jesus, o bom Amador (Ibid). 

E o entendimento que nos diz que não podemos ter melhor amigo que o Senhor (Ibid.). 

Para isso, são-nos pedidas umas atitudes fundamentais como: 

A esperança: “não vos desconsoleis, ainda mesmo que não respondais logo ao Senhor. Bem sabe Sua Majestade aguardar muitos dias e anos” (2M 2) 

A perseverança: “Ah! Senhor meu! Aqui é mister a vossa ajuda, pois, sem ela, não se pode fazer nada. Por vossa misericórdia não permitais que esta alma seja enganada para deixar o que começou” (2M 6) 
Desde o princípio, não pretender regalos na oração, mas aceitar a secura abraçando-nos à cruz de Jesus. Se o Senhor nos der algum gosto, agradecê-lo. 
Nesta luta, iremos descobrindo o grande mal que nos faz andar derramados no exterior, sem podermos sossegar no nosso interior e procurando fora a paz que não vivemos em nós próprios. 
Saberemos também que começar a recolher-nos não se consegue à força de braços, mas com suavidade e tratando com pessoas experimentadas. Finalmente, Teresa dir-nos-á que: “pensar que havemos de entrar no Céu e não entrar em nós, conhecendo-nos e considerando a nossa miséria e o que devemos a Deus e pedindo-Lhe muitas vezes misericórdia, é desatino” (2M 11). 


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 

1- Perguntando-nos sinceramente diante do Senhor: - pode mais em nós o seu chamamento ou estamos demasiado dependentes de contentamentos e opiniões exteriores? 
Certamente saberemos fazer uma lista de tudo aquilo que nos tira liberdade para penetrarmos cada vez mais no nosso interior. 

2- Nas ocasiões em que temos de nos fazer fortes, que é o que mais ajuda a seguir em frente? A razão, a fé, a vontade, etc…? 
3- Oremos com as palavras de Teresa: “não vos desconsoleis, ainda mesmo que não respondais logo ao Senhor. Bem sabe Sua Majestade aguardar muitos dias e anos” (2M 3). 
4- Façamos memória agradecida pelo amor de Deus que “é muito bom vizinho e tão grande a sua misericórdia e bondade que, mesmo estando nós em nosso passatempo, negócios, contentamentos e bagatelas do mundo, e até caindo e levantando-nos em pecados… com tudo isto, tem em tanto este Senhor nosso que O amemos e procuremos sua companhia, que, uma vez ou outra, não deixa de nos chamar para que nos acerquemos a Ele…” (2M 2) 
5- Finalmente, contemplemos Jesus acompanhados com o seguinte texto: “O mesmo Senhor nos diz: «Ninguém subirá a meu Pai, senão por Mim… e quem Me vê a Mim vê a meu Pai». Pois se nunca olhamos para Ele, nem considerarmos o que Lhe devemos e a morte que sofreu por nós, não sei como O podemos conhecer nem fazer obras em seu serviço. Porque a fé, sem elas, e sem irem unidas ao valor dos merecimentos de Jesus Cristo, nosso Bem, que valor pode ter? E quem nos despertará a amar este Senhor?” (2M 11).