segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Fundações: Capítulos 15-16



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Nos capítulos 15 e 16, Teresa narra-nos a fundação complicada e árdua de Toledo. Esta fundação que, à primeira vista, poderia parecer a mais fácil e cómoda por residir em Toledo dona Luísa de la Cerda, grande benfeitora de Teresa, vai converter-se numa verdadeira corrida de obstáculos. Por trás, como causa de tudo isso, um tema central do pensamento teresiano: a linhagem e a honra. Tanto que até intervém o próprio Deus para que ponha de lado esses critérios humanos.

No capítulo 16, elogia o exemplo de algumas monjas sobretudo no exercício da obediência e do desprendimento. Relata também a morte serena e alegre de uma religiosa com a visão de Jesus à cabeceira da cama, com os braços abertos em atitude de protecção e ajuda. E as palavras de Jesus de que ampararia igualmente as monjas que morressem nesses mosteiros. Daí surge o pedido de Teresa: “Filhas minhas, esforcemo-nos por ser verdadeiras carmelitas” (F 16,5).”Praza a Nosso Senhor, irmãs, que vivamos como verdadeiras filhas da Virgem e nos conformemos com a nossa profissão, para que Nosso Senhor nos faça a mercê que nos prometeu” (F 16,7). 

Pistas de leitura 

A fundação de Toledo é a “quinta” de Teresa no seu duplo sentido de ordem numérica e de lugar de descanso. Um mercador adinheirado de Toledo, Martim Ramírez, através do jesuíta Paulo Hernández, decide custear a fundação de um novo Carmelo. Não pertence à nobreza, e os nobres afastam-se: “Não eram pessoas ilustres nem fidalgas” (F 15,15). Grave contrariedade numa cidade onde a ascendência e a linhagem desempenham um papel determinante. 
As dificuldades aumentam porque, falecido o mercador, os seus parentes próximos mostram-se tão exigentes que a fundação parece impossível. Sem uns (nobres) nem outros (parentes de Martim), só com a colaboração do jovem Andrada, “nada rico, muito pobre até” (F 15,6), Teresa consegue casa e licença do Governador, mas não do Conselho.Com os poucos dinheiros que tem compra dois quadros; e apenas com dois enxergões e uma manta funda o mosteiro de Toledo. 
Renovam-se as dificuldades “sempre estimei mais a virtude do que a linhagem; mas tinham ido com tantos ditos ao Governador, que ele só me deu licença com a condição de que fundasse como em outras partes” (F 15,15). E aos ilustres e cavalheiros cede-lhes a capela e nada mais. Relações difíceis entre linhagem e virtude! 

Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 

1. “Os caminhos de Deus!” (F 15, 8). Ler todo o parágrafo anterior e comentar, segundo o pensamento de Teresa, se os caminhos do Senhor são os nossos caminhos. O binómio “as pessoas tão ricas – o muito pobre Andrada” desemboca num estilo de fundação feita “com pobreza e trabalho”. Ineficácia dos ricos, proveito do pobre. 
- Custa-nos descobrir nas mediações pobres as marcas da acção de Deus? 
- É-nos mais próxima a presença de Deus nos meios mais abastados e seguros? 

2. “Talvez pareça impossível que, estando em casa daquela senhora [dona Luísa de la Cerda] tão minha amiga, começasse com tanta pobreza. Não sei a causa, só sei que Deus quis dar-nos a experimentar a excelência desta virtude. Nada lhe pedi, pois não gosto de me tornar pesada; e ela, possivelmente, nem reparou” (F 15,13). 
-Não resulta exemplar a bondade de Teresa ao considerar a “inadvertência” de dona Luísa de la Cerda? 
- Podemos melhorar a nossa benevolência perante o descuido dos outros? 
- Talvez esteja Deus por trás das “distracções” dos outros para nos tornarmos mais livres e pobres? 

3. “Tudo foi de muito proveito para nós, porque era tanto o nosso consolo interior e alegria, que muitas vezes me lembro quanto o Senhor encerra nas virtudes. Essa privação que passámos parecia como que uma suave contemplação” (F 15,14). 
-Como compreendemos o contraste entre não ter praticamente nada e estar cheios de consolo e alegria? 
Diz Teresa que viver uma virtude é promessa de uma experiência suave de Deus. Será porque o autêntico necessitado encontra tudo n’Ele? 

4. Insistindo no mesmo tema, Teresa afirma que, quando começam a dar-lhes de tudo, experimente a tristeza e a pena de ver como se lhes escapa a riqueza de serem pobres. E as suas monjas sentem da mesma maneira. Ela ficou com o “senhorio bastante para ter em pouco os bens temporais, pois a falta deles faz crescer o bem interior, o qual traz de certeza consigo outra fartura e quietação” (F 15,15). 
- Esta maneira de pensar é qualquer coisa de ilusório no nosso contexto social actual? 
- Que nos quer dizer Teresa com estas palavras: fartura e quietação? 



Bibliografia: 

1. Álvarez, Tomás, 100 fichas sobre Teresa de Jesús, Burgos, Monte Carmelo 2007. 
2. Álvarez, Tomás, Comentarios al libro de las «Fundaciones», Burgos, Monte Carmelo 2011


terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Fundações: Capítulos 9-12



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Acompanhamos Teresa na fundação dos Mosteiros de Malagón na província de Ciudad Real (11 de Abril de 1568) e de Valhadolid (15 de Agosto de1568). E, conjuntamente à acção de Deus através das circunstâncias ordinárias e comuns da vida, vai-nos apresentar duas figuras femininas do incipiente Carmelo descalço: Cassilda de Padilha e Beatriz da Encarnação.

Pistas de leitura 

Teresa relata a fundação de Malagón durante os últimos dias da sua estadia em Salamanca, em 1573. Nos começos de 1574, transfere-se para Alba de Tormes e Segóvia, onde erigirá o novo Carmelo descalço a 18 de Março. Nele incorporará boa parte das carmelitas de Pastrana, a princípios de Abril, depois de abandonar aquela fundação por causa das intromissões e caprichos da princesa de Éboli. Em Segóvia, Teresa vai dispor de quase seis meses de tranquilidade antes de se apresentar na Encarnação para terminar o seu triénio como prioresa. É, portanto, na paz do novo Carmelo de Segóvia, onde retoma o fio das fundações com o mosteiro de Valhadolid. 
É interessante notar que foi no mosteiro de Malagón (provavelmente a 9 de Fevereiro de 1570) onde pela primeira vez Teresa teve a inspiração de escrever o livro das Fundações: “Que escrevesse a fundação dessas casas. Pensando eu como na de Medina nunca tinha achado nada para escrever sobre a fundação, disse-me ‘que mais quereria eu para ver que a sua fundação tinha sido milagrosa?’ Quis dizer com isto que só Ele a tinha feito e, parecendo não levar nenhum caminho, eu me determinara a pô-lo por obra” (Relação 9ª) 

Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 

1.Teresa é partidária de não fundar nenhum convento com renda. Em princípio, recusa a fundação em Malagón, uma pequena povoação de Ciudad Real. No entanto, aconselhada por pessoas sensatas, muda de opinião. 
- Qual a razão última das nossas posições inamovíveis: afirmar-me a mim mesmo ou procurar o bem alheio como serviço do Senhor? “Disseram-me que fazia mal, porque havendo para isso licença do Santo Concílio, não se devia deixar de fazer um mosteiro, por causa de uma opinião minha, onde tanto se podia servir ao Senhor” (F 9, 3). 
- Acaso não nos fechamos em seguranças enganosas que nos afastam de uma atitude serena de diálogo impedindo a consecução de um bem maior? 

2. Falando de possessões e heranças, que com tanto afinco são conservadas e desejadas, Teresa concentra a sua e nossa atenção no que teve e nos deixou Jesus Cristo: trabalhos, sofrimentos e desonra: “Eia, pois, filhas minhas, tem de ser esta a nossa divisa se quiséramos herdar o Seu reino. Não é com descanso, nem regalos, nem honras, nem riquezas que se há-de ganhar o que Ele comprou com tanto Sangue” (F 10, 13) 
- Como traduzimos na nossa vida pessoal este convite de Teresa? Será que a nossa vida se assemelha à de Jesus, ou procuramos antes a nossa comodidade? 

3. Com essa elegância própria de Teresa, finamente carregada de ironia, adverte aos “cavaleiros de Jesus Cristo e aos príncipes da sua Igreja” que procuram e até justificam um caminho diferente do da cruz: “Ó gente ilustre! Por amor de Deus abri os olhos! Vede que os verdadeiros cavaleiros de Jesus Cristo e os príncipes da Sua Igreja, um S. Pedro, um S. Paulo, não levavam o caminho que levais! Pensais, porventura, que há-de haver um caminho novo para vós? Desenganai-vos!” (F 10, 11). 
- Também nós pensamos, acaso, que nos convém outro caminho diferente do de Jesus? Se assim pensamos, não será uma fonte de mediocridade pessoal e de desigualdades fraternas? 

4. À margem das peripécias da vocação de Cassilda Padilha, Teresa deixa-nos algumas pérolas de como deverá ser a vida religiosa (e qualquer género de vida cristã): “servi-l’O [Sua Majestade] com grandíssimo contento, humildade e desapego do mundo” (F 11, 10) 
-Somos felices na nossa vida religiosa ou familiar? Esta felicidade dependerá de servi-l’O a Ele em tudo? 
- Será a humildade uma palavra vazia de sentido, actualmente? Ou não será antes um cristal que nos ajuda a ver as coisas com maior objectividade, tal como são? A soberba e a presunção não deturpam a realidade? 

5. Outros valores que devem embelezar a vida dos membros de uma comunidade no seio da Igreja: 
“De tão agradável condição e entendimento” (F 11, 11). “Uma alegria modesta que dava bem a entender o gozo interior que trazia na alma” (F 12,1). “Nunca se queixou de qualquer coisa ou de qualquer irmã” (F 12,1). “É incalculável o valor da mais pequenina coisa que se faça por amor de Deus” (F 12, 7). “ Poderá ser que diga mais alguma coisa acerca dela [algumas irmãs dos mosteiros], para que as que andam com alguma tibieza se esforcem por imitá-las e para que todas louvemos o Senhor que assim resplandece Sua grandeza numas fracas mulherzinhas” (F 12,10). 
- Cultivamos estes e outros valores nas nossas relações quotidianas no seio da comunidade, da família, da Igreja?