Nos capítulos 15 e 16, Teresa narra-nos a fundação complicada e árdua de Toledo. Esta fundação que, à primeira vista, poderia parecer a mais fácil e cómoda por residir em Toledo dona Luísa de la Cerda, grande benfeitora de Teresa, vai converter-se numa verdadeira corrida de obstáculos. Por trás, como causa de tudo isso, um tema central do pensamento teresiano: a linhagem e a honra. Tanto que até intervém o próprio Deus para que ponha de lado esses critérios humanos.
No capítulo 16, elogia o exemplo de algumas monjas sobretudo no exercício da obediência e do desprendimento. Relata também a morte serena e alegre de uma religiosa com a visão de Jesus à cabeceira da cama, com os braços abertos em atitude de protecção e ajuda. E as palavras de Jesus de que ampararia igualmente as monjas que morressem nesses mosteiros. Daí surge o pedido de Teresa: “Filhas minhas, esforcemo-nos por ser verdadeiras carmelitas” (F 16,5).”Praza a Nosso Senhor, irmãs, que vivamos como verdadeiras filhas da Virgem e nos conformemos com a nossa profissão, para que Nosso Senhor nos faça a mercê que nos prometeu” (F 16,7).
Pistas de leitura
A fundação de Toledo é a “quinta” de Teresa no seu duplo sentido de ordem numérica e de lugar de descanso. Um mercador adinheirado de Toledo, Martim Ramírez, através do jesuíta Paulo Hernández, decide custear a fundação de um novo Carmelo. Não pertence à nobreza, e os nobres afastam-se: “Não eram pessoas ilustres nem fidalgas” (F 15,15). Grave contrariedade numa cidade onde a ascendência e a linhagem desempenham um papel determinante.
As dificuldades aumentam porque, falecido o mercador, os seus parentes próximos mostram-se tão exigentes que a fundação parece impossível. Sem uns (nobres) nem outros (parentes de Martim), só com a colaboração do jovem Andrada, “nada rico, muito pobre até” (F 15,6), Teresa consegue casa e licença do Governador, mas não do Conselho.Com os poucos dinheiros que tem compra dois quadros; e apenas com dois enxergões e uma manta funda o mosteiro de Toledo.
Renovam-se as dificuldades “sempre estimei mais a virtude do que a linhagem; mas tinham ido com tantos ditos ao Governador, que ele só me deu licença com a condição de que fundasse como em outras partes” (F 15,15). E aos ilustres e cavalheiros cede-lhes a capela e nada mais. Relações difíceis entre linhagem e virtude!
Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…
1. “Os caminhos de Deus!” (F 15, 8). Ler todo o parágrafo anterior e comentar, segundo o pensamento de Teresa, se os caminhos do Senhor são os nossos caminhos. O binómio “as pessoas tão ricas – o muito pobre Andrada” desemboca num estilo de fundação feita “com pobreza e trabalho”. Ineficácia dos ricos, proveito do pobre.
- Custa-nos descobrir nas mediações pobres as marcas da acção de Deus?
- É-nos mais próxima a presença de Deus nos meios mais abastados e seguros?
2. “Talvez pareça impossível que, estando em casa daquela senhora [dona Luísa de la Cerda] tão minha amiga, começasse com tanta pobreza. Não sei a causa, só sei que Deus quis dar-nos a experimentar a excelência desta virtude. Nada lhe pedi, pois não gosto de me tornar pesada; e ela, possivelmente, nem reparou” (F 15,13).
-Não resulta exemplar a bondade de Teresa ao considerar a “inadvertência” de dona Luísa de la Cerda?
- Podemos melhorar a nossa benevolência perante o descuido dos outros?
- Talvez esteja Deus por trás das “distracções” dos outros para nos tornarmos mais livres e pobres?
3. “Tudo foi de muito proveito para nós, porque era tanto o nosso consolo interior e alegria, que muitas vezes me lembro quanto o Senhor encerra nas virtudes. Essa privação que passámos parecia como que uma suave contemplação” (F 15,14).
-Como compreendemos o contraste entre não ter praticamente nada e estar cheios de consolo e alegria?
Diz Teresa que viver uma virtude é promessa de uma experiência suave de Deus. Será porque o autêntico necessitado encontra tudo n’Ele?
4. Insistindo no mesmo tema, Teresa afirma que, quando começam a dar-lhes de tudo, experimente a tristeza e a pena de ver como se lhes escapa a riqueza de serem pobres. E as suas monjas sentem da mesma maneira. Ela ficou com o “senhorio bastante para ter em pouco os bens temporais, pois a falta deles faz crescer o bem interior, o qual traz de certeza consigo outra fartura e quietação” (F 15,15).
- Esta maneira de pensar é qualquer coisa de ilusório no nosso contexto social actual?
- Que nos quer dizer Teresa com estas palavras: fartura e quietação?
Bibliografia:
1. Álvarez, Tomás, 100 fichas sobre Teresa de Jesús, Burgos, Monte Carmelo 2007.
2. Álvarez, Tomás, Comentarios al libro de las «Fundaciones», Burgos, Monte Carmelo 2011
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