terça-feira, 19 de junho de 2012

Fundações: Capítulo 22









Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES – I 

Capítulo 22 
Se Granada foi o escritório de S. João da Cruz, Toledo não o foi menos para Teresa de Jesus. Aqui, na cidade imperial, desde uma pobre cela do Carmelo, escreve o relato da sua primeira fundação em terras andaluzas: Beas de Segura, província de Jaén.
Tempos aqueles, desde esse fecundo ano de 1576, classificado por Teresa como de grandes trabalhos, até ao ponto dela crer que ser a causa de toda esta tormenta, e que se me deitassem ao mar, como Jonas, cessaria a tempestade (F 28, 5). 
Navegando neste mar tempestuoso e salva do naufrágio, porque, agora sim, está arrimada a esta forte coluna da oração (V 8,2), Teresa de Jesus recorda aquela difícil e complexa aventura fundacional que a levou a Andaluzia, sem o saber, pondo em risco a sua relação afectuosa, em breve desfeita, com o P. Geral Rubeo. 
Em Beas, teve lugar o encontro idílico com Jerónimo Graciano, personagem chave da sua Reforma. Aqui se forjou a entranhável relação mestre-discípulas, entre João da Cruz e as carmelitas de Beas, com abundância de “bilhetinhos” espirituais conservados devotamente por elas, e que hoje formam uma grande parte dos Ditos de Luz e Amor do Santo. Também em Beas, teve Teresa a sua gota de amargura: foi o lugar onde recebeu a dura notícia do sequestro do Livro da Vida nas mãos da terrível Inquisição. 

Pistas de leitura 
1- Os inconvenientes (F 22,1-2) 
- Uma viagem longa a perigosa (a passagem de Despeñaperros, Serra Morena e os altíssimos penhascos de Gualdinfierno) para uma mulher de 60 anos, de saúde frágil e em pleno inverno. 
- Uma pequena povoação, nada semelhante aos ambientes urbanos preferidos por Teresa, muito pouca renda (F 22, 19), tão longe da sua Ávila natal, para ela ponto de referência das distâncias. 
- A oposição do P. Pedro Fernández às novas fundações, foi superada surpreendentemente por outra dificuldade maior: Beas pertencia à Comenda de Santiago e era supostamente impossível conseguir a devida licença. 
Nesta ocasião, uma dificuldade ajuda a resolver a outra, e o próprio Filipe II outorga a licença ao saber que o futuro mosteiro era das descalças do Carmo (F 22,18). 
Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES – II 

Algumas vezes penso nisto – dirá Teresa – e como o que Nosso Senhor quer, embora o não queiramos nós, se vem a realizar e chegamos a servir-Lhe de instrumento, mesmo sem darmos por isso, foi o que aqui aconteceu com o Padre Mestre Frei Pedro Fernández (F 22,3). 

2- “História Exemplar” de D. Catarina Godínez 
Tal como aconteceu com a fundação de Alba de Tormes, a biografia das fundadoras, ou antes, uma delas, D. Catarina, ocupa quase todo o capítulo (nn. 4-24). A Santa parece escrever valendo-se de um guião redaccional, talvez de mão alheia, onde se encontram registados os factos mais marcantes de tão extraordinária história: 
- Vida familiar de uma donzela fidalga rural; conversão e mudança de vida; práticas religiosas da jovem Catarina, agora “em hábito modesto”; oposição dos pais, doenças e luta enérgica para fundar o mosteiro, etc. 
- Encontramos no relato, momentos tão simpáticos como o do enfado ruidoso do demónio que fez sair da cama, de espada na mão e meio vestido, o bom D. Sancho. Sem dúvida que os estudantes de Medicina tirariam proveito desse “Pequeno Tratado” de História da Medicina do século XVI, escrito neste capítulo por Teresa de Jesus: todo um catálogo de doenças que formam um quadro clínico estranho e heterogéneo, juntamente com os remédios aplicados (ventosas, mais de 500 sangrias, cautérios, etc.) que demonstram a fortaleza física de D. Catarina que, apesar de tudo, foi capaz de sobreviver… 
- A chave desta história estranha e divertida encontra-se no n. 6: Teresa escreve para que todos O louvem - a Deus, certamente, verdadeiro protagonista do livro. É por isso que, no n.7, encontramos uma linda oração emocionada, com sabor evangélico: Sede bendito, ó meu Deus, para sempre, pois num momento abateis uma alma e a levantais renovada… 

3- História “Actual” da fundação (F 22,19-20) 
Apenas um par de números dedicados ao momento da fundação, tão breves que só referem o ano, 1575, da chegada das carmelitas chefiadas por Teresa no princípio da Quaresma, a alegria do povo, o nome do novo mosteiro (S. José do Salvador, fundado no dia de S. Matias) e uma breve menção da tomada de hábito das duas irmãs fundadoras, mas, isso sim, adornada com novos elogios à inigualável Catarina. 



Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –III 

Finalmente! O que Sua Majestade quer não se pode deixar de fazer (F 22,19). 

4- Apêndice (F 22, 1-24) 
O relato parece concluir no nº 20 com a frase final, mas Teresa acrescenta uma espécie de apêndice em que encontramos: 
- O modo “sobrenatural” como Catarina conhece a existência da Ordem do Carmo e a sua Regra, assim como o encontro com o jesuíta que lhe dá notícia dos nossos mosteiros (F 22, 21-22). 
- Novos pormenores da cura milagrosa (F 22, 23). 
- Virtudes de D. Catarina, já convertida em Catarina de Jesus, de quem Teresa traça com mão firme um retrato magistral: Nenhuma coisa vejo fazer a esta alma que não seja para ser agradável a Deus, e é assim com todas (F 22, 24). Prova de que “não é encarecimento” (como diria a Santa) é o testemunho deixado pelo Padre Graciano na sua Peregrinação de Anastácio, diálogo 16, pois escreve que a Madre Catarina é das maiores santas da Ordem. Por outro lado, o próprio S. João da Cruz se encarregou de transcrever de sua própria mão, o texto da sua autobiografia. 
- E, agora sim, Ámen. 

Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 
1 – Lê e medita na conversão de Catarina Godínez diante do crucifixo (F 22, 5-6); compara com V 9, 1-3, onde Teresa nos conta a sua conversão ao ver uma imagem de Cristo muito chagado. 
2 – Pode ser um bom momento para pensar e partilhar com o grupo o teu encontro com Jesus e como mudou a tua vida. 
3 – Ora com Teresa, bendiz e louva o Senhor (F 22, 7) 
4 – Julgo que Nosso Senhor nunca faz a uma alma mercê tão grande, sem que outras almas dela participem (F 22, 9). 
Esta interdependência entre os membros do corpo místico de Cristo é muitas vezes apontada por Teresa em diversos textos (4M 3,10; 5M 4,6, entre outros). 
Ficha X.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –IV 

Cada um de nós não anda sozinho o caminho escolhido: para bem ou para mal, arrasta outros consigo. 

- Somos conscientes desta realidade, que é uma responsabilidade muito séria? 
- Acaso o individualismo pós-moderno, que todos padecemos, nos leva a nos esquecermos da força do testemunho cristão? São Paulo diz que temos de levar as cargas uns dos outros. 
- Ter-nos-íamos deixado “contaminar”, quase sem dar por isso, da tendência laicizante que trata de se impor, segundo a qual a fé deve ser vivida no âmbito privado e estritamente pessoal? 
- É a minha oração um intimismo mais ou menos subtil? 
Recorda que Para isto é a oração, filhas minhas; para isto serve este matrimónio espiritual: que nasçam sempre obras, obras (7M 4,6). 
- Reza novamente com Teresa CC 1, nº 14; V 16, 6-7. Partilha a tua oração sobre estes textos com o grupo de oração, comunitário, paroquial, etc. 
5 – E, por fim, um pedido: 
Praza a Sua Majestade que a grandíssima liberalidade que tem tido com esta miserável pecadora sirva, de algum modo, para que se esforcem e animem os que isto lerem, a deixar tudo, de todo em todo, por Deus (V 21,12).


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