LIVRO DAS FUNDAÇÕES –I
Capítulos 20-21
Teresa de Jesus, no seu forçado retiro toledano (1576), escreve o relato da fundação de dois Carmelos especiais: Alba de Tormes (1571) e Segóvia (1574). Ambos passarão à história do Carmelo teresiano não só pela pequena história de cada um, mas porque vão acolher o imprevisto: os restos mortais da M. Teresa, o primeiro, e o grupinho de monjas de Pastrana fugidas dos caprichos tirânicos de D. Ana de Mendoza, Princesa de Éboli, o outro.
Ambas as fundações contam com a presença activa de S. João da Cruz e com uma alargada e bela galeria de retratos, proporcionando-nos também uma série de preciosos dados sobre a vida social espanhola do séc. X VI.
Pistas de leitura.
1- Quem é o fundador?
Se nos cingirmos ao relato de Teresa, trata-se da insistência do administrador do Duque de Alba e sua mulher: fui importunada para que naquela cidade fizesse uma fundação e mosteiro (F 20,1), o que faz com que Teresa de Jesus funde em Alba, apesar da sua resistência inicial, por ser o lugar pequeno e ter de fundar com renda.
Em troca, o Carmelo segoviano surge por mandato do Senhor: Estando ali um dia em oração, disse-me Nosso Senhor que fosse fundar em Segóvia (F 21,1).
2- Retrato de senhoras nobres
Em ambos os capítulos sobressai a figura das fundadoras, D. Teresa de Láyz e D. Ana de Jimena, se bem que de maneira muito diferente. A figura amável e delicada de D. Ana, futura carmelita e prioresa de Segóvia, ocupa somente um par de números (F 21,2 e 3), enquanto Teresa de Láyz se apodera materialmente do capítulo, de modo que quase até ao nº 13 não se retoma a história da fundação
A esposa do administrador Velázquez, que ocupa um lugar secundário no relato, representa a típica benfeitora intrometida que deu muito trabalho à Santa, não só durante a fundação (tornou-se difícil chegar a um acordo, F 20,13), mas também depois (Carta ao P. Jerónimo Graciano, Palência, meados de Fevereiro de 1581) e 2d
Ficha IX.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –II
3- Apontamentos de história do século XVI: a fundação de Alba de Tormes.
- O problema da honra: fidalga pobre envergonhada, marido rico descendente de judeus conversos, que “limpa” a sua linhagem mediante o matrimónio.
- A condição social da mulher no século XVI: o nascimento de uma filha, uma “tragédia” familiar.
- Fundar o convento é outra maneira de se enobrecer.
- A subtil ironia teresiana, não isenta de dor, perante estes factos (F20, 2 e 3).
- A presença do “maravilhoso”: o demónio omnipresente na vida quotidiana, e também os Santos (F 20, 4.7.8).
- De novo o problema da renda e o Concílio de Trento (nn. 1 e 13).
4- Paisagens com rosto: a fundação de Segóvia.
- Religiosos, clérigos, cavalheiros, damas, provedores ciosos, desfilam por este delicioso capítulo de aparência simples. Uma fundação da qual Teresa diz que teve pouco trabalho, mas que a empreendeu doente e com grandes males interiores (F 21,4).
- As personagens:
- O comissário apostólico Pedro Fernández, que concedeu a licença para fundar, apesar de que não desejava que se fizessem mais fundações (n. 1), segundo diz Teresa, prioresa da Encarnação e residente temporária em Salamanca.
- A família Jimena: D. Ana e a sua filha; André de Jimena, o cavalheiro que lha pediu em nosso nome (n.5) e a sua irmã carmelita Isabel de Jesus, aquela jovem cantora que provocou o êxtase da Madre Fundadora (Relação 13)
- João da Cruz e Julião de Ávila, maltratados pelo iracundo provedor que quis levar preso frei João e tirou o Santíssimo Sacramento às pobres monjas.
- O cavalheiro de Alba, António Gaytán, de quem a nossa escritora traça um belo retrato (nn. 6 e 7).
- O licenciado Herrera e aquele “sobrinho do Bispo” que fazia quanto podia a nosso favor; João Orozco e Covarrubias de Leiva.
- Os pleitos, protagonistas de tantas fundações, com religiosos (mercedários, franciscanos) e com o cabido (nn. 8 e 9).
- E, como quase sempre, o dinheiro facilita tudo (n. 10).
Para reflectir, rever, interceder, agradecer, contemplar.
1- Pobreza e liberdade:
- Teresa de Jesus é uma apaixonada pela liberdade, a santa liberdade de espírito, e portanto inimiga de toda a dependência escravizante, seja a da honra ou dos benfeitores que se algum regalo dão ao corpo, paga-o bem o espírito (CP 9,1).
Ficha IX.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –III
-Neste contexto, lê o capítulo 2 de Caminho de Perfeição e compara-o com o 20 de Fundações:
- Que dependências escravizantes encontras na tua vida?
- Os olhos em vosso Esposo… - Olhas outros olhos? (o “que dirão”, a tua imagem, por não perder benefícios de qualquer tipo)
- Na tua situação, a quem precisas de contentar: Deus ou outros) (CP 2, 5). Revê F 21,7.
2- A mulher no século XVI (F 20,2 e ss):
-Sem feminismos anacrónicos, revê a situação da mulher no teu contexto cultural e eclesial.
- Existem perto de ti pessoas tão marginalizadas hoje, pela sua condição, raça, cultura, talvez na tua paróquia, grupo, comunidade?
3- Pareceu-me coisa impossível (F 21,1).
Pensa nalguma situação concreta da tua vida pessoal, familiar, à tua volta, que te pareça impossível de superar, embora saibas que nisso está precisamente a vontade de Deus.
- Teresa, que faz? E tu?
O amor de contentar a Deus e a fé tornam possível o que por razão natural não o é (F 2,4)
4- Para as que vierem se animem a continuar tão bons princípios (F 20,15).
- Que traz à tua vida a leitura das Fundações?
5- Ora com Teresa:
“Ó amor poderoso de Deus! Quão diferentes são teus efeitos dos do amor do mundo! Este não quer companhia por lhe parecer que lhe hão-de tirar o que possui. O do meu Deus, quantos mais amadores entende que há, mais cresce e, assim, seus gozos se temperam ao ver que não gozam todos daquele bem.
E então, [a alma] procura meios para buscar companhia e de boa vontade deixa o seu gozo, quando pensa que terá parte em que outros O procurem gozar.
Ó Jesus meu, que grande é o amor que tendes aos filhos dos homens! Que o maior serviço que Vos pode prestar é deixar-Vos a Vós por seu amor e lucro. E então sois possuído mais inteiramente… (Exclamações, 2).
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