quinta-feira, 12 de julho de 2012

Fundações: Capítulos 25-26


 


Ficha XII.- LIVRO DAS FUNDAÇÕES –I 
Nos capítulos seguintes, assistimos ao relato da inauguração do Carmelo de Sevilha, com a ajuda inestimável dos novos amigos e benfeitores de Teresa: o seu irmão Lourenço, o sacerdote sevilhano Gaciálvarez, e o Prior da Cartuxa, Hernando de Pantoja (F 25). Instala-se o Santíssimo Sacramento após uma solene procissão e a bênção do Arcebispo Cristóvão de Rojas (27.05.1576), e no dia seguinte a Madre põe-se novamente a caminho de Castela (F 26,1-2). Como epílogo, a narração encerra com a memória edificante da primeira vocação andaluza; Beatriz da Madre de Deus (F 26,3-16).


Pistas de leitura 
Há três aspectos a destacar no momento de abordar a leitura destes capítulos: a pobreza e as dificuldades que Teresa encontra em Sevilha, contra o que era de supor; o novo grupo de amigos que ajudam a Madre em tudo o que respeita à compra da nova casa; e os conflitos institucionais e graves acusações que afectam nessa altura os Descalços e Teresa dentro da Ordem. 

1. Pobreza e dificuldades: “Ninguém podia prever que numa cidade tão importante e de gente tão rica como Sevilha, haveria menos ajudas para fundar do que em qualquer das outras partes onde estivera” (F 25, 1). “Exceptuando a primeira fundação de Ávila […] nenhuma outra me custou tanto como esta, por serem os trabalhos, na sua maioria, interiores” (26,2). No mês de Dezembro de 1575, uma noviça acusa as descalças de Sevilha perante a Inquisição. Nos princípios do ano seguinte, uma comissão, em nome da Inquisição, examina o espírito da Madre. Duas Contas de Consciência, em que Teresa expõe o seu caminho espiritual, os confessores que a acompanham e a sua oração1, são fruto do processo inquisitorial a que foi submetida, a sua resposta às informações pedidas pelo tribunal. 

2. Novos colaboradores: Garciálvarez, “pessoa muito de bem e conhecida na cidade pelas suas boas obras” (25,2). Oferece-se para celebrar a missa diária à nova comunidade e impede a compra de um edifício nada conveniente para mosteiro. Além disso, encarregar-se-á de ornamentar a clausura e a igreja para a inauguração (25,12). Lourenço de Cepeda, recentemente chegado da América: “ajudou-nos muito, sobretudo em conseguir que ficássemos na [casa] em que agora estamos” (25,3). E Hernando Pantoja, “um santo velho, prior da Cartuxa de las Cuevas, grandíssimo servo de Deus” (25,9), que ajudou com as suas esmolas, fazendo-lhes bem “por todos os meios”. Ele e Garciálvarez combinarão com o arcebispo toda a solenidade da procissão, com a presença de clérigos e confrarias da cidade. Por uma carta de Teresa, conhecemos um pormenor que humildemente cala no relato desta fundação: o arcebispo D. Cristóvão de Rojas e Sandoval ajoelha-se diante da Madre, pedindo-lhe a sua bênção. Assim o contará a Ana de Jesus: “Imagine o que sentiria ao ver um tão grande prelado ajoelhado na frente desta pobre mulherzinha, sem se querer levantar até que lhe desse a bênção, na presença de todas as religiões e confrarias de Sevilha”2. 

3. Conflitos institucionais: Imediatamente após a inauguração, Teresa parte para Castela. Incompreendida e desprestigiada, chegou-lhe uma ordem do Definitório geral, reunido em Piacenza, de acabar com as fundações e recolher-se num dos seus conventos. A ordem foi adiada temporariamente por Graciano, mas agora chegara o momento e escolhe Toledo. Escreve ali o 26 capítulo, o último dedicado à Fundação de Sevilha. É o pano de fundo vivido e velado no relato que virá à luz no capítulo seguinte. Alguns dos ‘trabalhos interiores’ que Teresa padece nessas datas3. 


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 

1. Todas as gestões por conseguir uma casa em condições resultam inúteis. Passam-se noves meses de longa espera (F 25,1-2) numa incómoda casa alugada. Tudo resulta inconveniente e apertado numa cidade onde paradoxalmente abundam os recursos. 

Tendo como horizonte que a verdadeira esperança teologal sabe confiar-se totalmente a Deus na adversidade e na prosperidade, receber tudo como Seu, mas sem renunciar ao esforço, ao caminho e à meta… - Como reagimos perante as nossas fragilidades e temores, ou perante o êxito de um projecto alcançado? 

2. Teresa sofre com a ideia de ter de regressar a Castela deixando as suas filhas sem casa definitiva. Para encontrá-la, serve-se de todas as mediações: a oração, a ajuda do seu irmão Lourenço e Garciálvarez, e as suas próprias diligências embora infrutíferas: “Estando um dia em oração, pedindo a Deus que lhes desse casa, pois eram esposas Suas, tão unicamente desejosas de agradar-Lhe, recebi como resposta: Já vos ouvi. Deixa isso a meu cuidado” (25,4). 

Às vezes, nas dificuldades, é fácil perder o equilíbrio e cair nos extremos: esperar tudo de Deus, descarregar a responsabilidade nos outros, ou esperar tudo de nós mesmos. – Sabemos unir a oração e a confiança na ajuda de Deus e dos irmãos com uma atitude responsável e diligente da nossa parte? 

3. Encontram finalmente uma casa conveniente para a comunidade e mudam-se para lá. Levarão um mês a adaptar-se ao lugar e a fazer a igreja. Teresa conta-nos: “ Era meu desejo colocar o Santíssimo Sacramento sem aparato, depois de estar tudo concluído, porque sou inimiga de me tornar pesada quando o posso evitar. E assim, dirigi-me ao Padre Garciálvarez que, por sua vez, tratou com o prior de Las Cuevas” (25,11) 

Conhecemos o desenlace: estes bons homens, juntamente com o arcebispo, decidiram inaugurar o mosteiro com a maior solenidade possível. Levada a empresa a feliz termo, Teresa pode descansar. No dia seguinte, regressa a Castela. Mas não se queixa; alegra-se de ter compartilhado com as suas irmãs as penúrias e conflitos daqueles meses: “sobretudo, dava-me alegria ter gozado dos trabalhos e ir-me quando podia ter algum descanso” (26,1). 

A atitude da Madre revela uma grande delicadeza: simplicidade e sentido prático, e sobretudo caridade para não sobrecarregar ninguém com trabalhos que se podem evitar. Esta maneira de ser teresiana pode ajudar-nos a examinar pessoal e comunitariamente as nossas atitudes, particularmente a nossa caridade: não “se tornar pesada quando se pode evitar” 

Teresa descobre, a cada passo, a intimidade da sua alma, os seus estados de ânimo ou as suas lutas interiores, e ao mesmo tempo ensina-nos a viver a fraternidade, a vida em comunidade. - Como vivemos e manifestamos a alegria de compartilhar com os nossos irmãos penas e trabalhos? – Sem queixas, sem censuras, sem lhes sermos pesados, ajudando-nos mutuamente a levar os nossos fardos? 

4. A Santa termina a crónica de Sevilha com um relato vocacional. A história de Beatriz da Madre de Deus é uma das narrativas e biografias exemplares que amenizam o livro das Fundações4. Pela insistência, pela própria selecção de dados (trata-se do que se considera digno de ser contado), descobre-se o ideal destacado por Teresa como modelo para as futuras gerações. Uma coisa merece particular destaque: a firmeza de Beatriz nas contradições e a fidelidade ao ideal do Carmelo. No Caminho de Perfeição já a madre nos tinha aconselhado que, para a grande empresa da oração, é necessária “uma grande e determinada determinação” (C 21,2) de não abandonar o ideal, mesmo que se morra no caminho: “ a morrer sim, mas não a ficar vencidos” (C 3,1). 
Procurar outros paralelos com textos teresiano já trabalhados em fichas e capítulos anteriores, e reler o relato procurando descobrir substancialmente o ideal vocacional pintado por Teresa. Compará-lo com o nosso tempo, experiência e circunstâncias pessoais ou comunitárias. 


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1 Cf. Contas de Consciência, 53 e 54 (EDE e BAC); Relações 4 e 5 (Ed. Monte Carmelo). 
2 Carta dirigida à Madre Ana de Jesus, a 15 de Julho de 1576. Perdido o autógrafo e sem contar com manuscritos, conhecemos a sua existência e parte do seu conteúdo graças aos testemunhos da própria Madre Ana de Jesus no processo de Salamanca para a canonização de Teresa. 
3Cf. A carta que la Madre dirige nos fins de Janeiro de 1576 ao P. João Baptista Rubeo, Geral da Ordem. 
4 Veja-se, por exemplo, o relato de F 12.

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