Duas fundações novelescas, ou melhor, três (duas em Pastrana – frades e monjas, 1569, e uma em Salamanca, 1570), juntamente com uma série de conselhos oportunos às prioresas, de ontem e de hoje, constituem o enredo destes memoráveis capítulos.
Gozando da paz do seu Carmelo segoviano, em 1574, Teresa olha para trás a fim de construir um ameno relato entremeado de encontros e desencontros com aristocratas e cortesãos, ermitãos e comerciantes, cavaleiros insatisfeitos, estudantes burlescos e monjas assustadiças na noite de Finados – toda uma novela de aventuras em que se percebe claramente a acção de Deus que conduz a história.
Pistas de leitura
1- A Princesa e o ermitão (F 17):
- A Princesa de Éboli, D. Ana de Mendoza
Aconteceu mais ou menos assim: uma princesa intrigante e caprichosa tinha uma prima, D. Luísa de la Cerda, que tinha fundado um mosteiro dos da famosa monja Teresa na “sua” vila de Malagón. E, naturalmente, também quis o seu na “sua” vila de Pastrana, e por certo mais importante! Por isso, D. Ana não pode esperar: manda um criado para arrancar a Santa imediatamente de Toledo. É verdade que havia muito que as duas andávamos tratando da fundação…Mas não pensava que fosse para tão breve (F 17,2).Com razão se queixa Teresa dos senhores de cá (CP 22,4), tão diferentes do único Senhor!
Episódios como os de Cassilda de Padilha, D. Luísa de la Cerda, a Princesa de Éboli, que supera a todos, a duquesa de Alba, etc., mostram-nos quão mal se deu com eles, e projectam uma grande luz sobre essas páginas magistrais em que Teresa de Jesus fala da honra e da pobreza.
Ao lermos este capítulo, não podemos perder de vista a coragem de Teresa e das suas monjas ao levantarem a fundação, fugindo em plena noite para Segóvia. Este gesto custou a Teresa a denúncia à Inquisição do Livro da Vida por parte da vingativa princesa.
- O ermitão, Mariano Azzaro
Deste providencial encontro entre Teresa e o P. Mariano em Madrid nascerá a fundação de frades em Pastrana.
Nada que se compare com Duruelo, muito longe do humanismo teresiano, com personagens estranhos como Baltasar Nieto, o seu primeiro Superior (F 17,15) e que, apesar de tudo, em breve experimentará um grande apogeu vocacional (entre eles, o P. Graciano)
A estas alturas do relato, Teresa explora o entusiasmo pela sua “descoberta”, ponderando a vida do P. Mariano e seu companheiro (nº 7-8), embora não nos passe inadvertida a fina ironia com que nos relata que este Padre estava espantado por ter sido convencido tão rapidamente a tomar o hábito de descalço em especial por uma mulher (F 17,9).
2- Suavidade e discrição (F 18).
Ao começar a narrar a fundação de Salamanca, interrompe por duas vezes o relato; a primeira e mais breve, permite-nos contemplar o pano de fundo, por assim dizer, das fundações: os grandes trabalhos dos caminhos (F 18,4), a sua pouca saúde e a intervenção de Deus que lhe dá as forças de que precisa. A estrela que guia Teresa de Jesus no seu árduo e fatigoso caminhar brilha diante dos nossos olhos, vendo em serviço de Quem se fazia e considerando que naquela casa se haveria de louvar o Senhor e haver o Santíssimo Sacramento (F 18,5).
Na segunda, lembra-se de algumas coisas sobre isto de mortificação… digo-as já aqui, antes que me esqueçam (F 18,6) e começa a sua série de avisos às prioresas, que poderíamos resumir assim:
- Discrição (prudência) e suavidade no governo da comunidade (ou, como diríamos hoje, na coordenação do grupo).
- Nada de extravagâncias em penitências e mortificações. E isto numa época tão inclinada às “penitências de bestas”, em frase de S. João da Cruz, tal como chegou a acontecer no noviciado dos frades de Pastrana, com modelos apreciados como o de Catarina de Cardona, cujo retrato pintado por Teresa com pinceladas suaves e divertidas encontramos em F 28.
- Basta cumprir a Regra e as Constituições, embora saibamos que de guardar a guardar vai muito (CP 1,4)
- E uma regra de ouro: É necessário olhar muito a isto e não ordenar o que para nós mesmas seria duro (F 18,6), Evangelho genuíno, sem dúvida!
“Praza à divina Majestade que não nos faltem as moradas eternas” (F 19).
- Assim termina este capítulo 19 dedicado à fundação de Salamanca, particularmente trabalhosa devido às dificuldades surgidas com o vendedor da casa, Pedro de la Banda, e que continuarão durante anos. São palavras suficientemente expressivas do seu cansaço por causa da contenda, que parecia sem fim, às que une um elogio da comunidade que tudo levam com alegria (F 19,12).
- Ao começar o novo capítulo, Teresa justifica a longa digressão do capítulo anterior e ainda conclui com mais um aviso às prioresas (F 19,1).
- Continua, quase começa, com a narração da fundação de Salamanca, apresentando-nos o “anjo da guarda” da fundação: Nicolau Gutiérrez (F 19,2 2 9). Note-se, uma vez mais, como são os seus amigos comerciantes, o equivalente à classe média de hoje, os que sempre ajudam Teresa, muito ao contrário dos aristocratas e grandes senhores.
- O episódio cómico dos estudantes e da monja temerosa dão uma nota humorística (F 19, 3-6)
- A experiência ensina-nos a todos. Também a Teresa, que nesta fundação já aprendeu que não é preciso, para tomar posse, colocar o Santíssimo Sacramento, e, pela primeira vez, não o faz (F 19,3). Estava bem longe, evidentemente, de imaginar que as monjas estariam três anos sem ele (F 19,6), mas no final de Setembro de 1573 mudam para a nova casa e expõe-se o Santíssimo com toda a solenidade embora não sem alguma contradição (F 19,9-10).
Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…
1-“Os meus planos não são os vossos planos” (Is 55, 8).
- À luz da Palavra de Deus, relê F 17, 1-2). Teresa sente-se satisfeita por ter terminado a fundação de Toledo, pensando que naquela Páscoa podia gozar-me um pouco com Nosso Senhor (F 17,1-2), mas acontece o inesperado…
- Que sentes quando os teus planos são alterados por factores, pessoas, acontecimentos exteriores a ti?
Quando a tua vida “programada”, o descanso a que tens direito depois do trabalho, as tuas opções pessoais, são transtornados por acontecimentos inesperados, que não podes controlar: - Como reages? Achas que estás desprendido/a de ti próprio/a?
Pressupondo sempre o bem dos outros, evidentemente, lê neste contexto CP 32, 4-8) e recorda o que Teresa diz: Esta é a contemplação perfeita, de que me dissestes que escrevesse (CP 32,9).
- Depois de todo o trabalho e os desgostos da fundação de Pastrana, esta desfaz-se (F 17,17). Que diz Teresa?
Ora com ela, se te encontras em situações parecidas (mesmo que não tenhas fundado um mosteiro). Em suma, o Senhor o permitiu. Devia ter visto que não convinha ali aquele mosteiro, pois os seus juízos são grandes e contrários aos nossos entendimentos.
2- Comenta no grupo F 18, 4-5 e F 19,6. Vemos aqui retratado quanto lhe custaram a Teresa as suas fundações; compara e comenta F 4,5-7)
-Qual é a nossa /tua responsabilidade em continuar a sua obra? A que te comprometes?
3- Lê F 18,5 e medita na tua relação, orante e vital, com o Santíssimo Sacramento: fazes da tua vida um louvor a Deus?
F 18,8. – Achas que a mortificação está “passada de moda”? Teresa diz que é necessária para a alma adquirir liberdade…
Sem que ninguém te mande “coisas” extraordinárias, como aceitarias uma sã mortificação - contrariar os teus gostos - na vida ordinária?
Não pense a prioresa que conhece logo as almas; deixe, pois, isso para Deus (…) Procure levar cada uma por onde Sua Majestade a leva (F 18,9).
- É assim que actuamos nas comunidades, grupos paroquiais, em família?
- Julgamos rapidamente sem conhecer as pessoas nem as suas circunstâncias? Que margem deixamos ao mistério de Deus no noutro?
4- F 19,9: um exemplo de que também Teresa sobre altos e baixos emocionais quando os acontecimentos a ultrapassam, mas Nicolau Gutiérrez, com a sua inalterável serenidade… dizia-me muito mansamente que não me afligisse, pois Deus daria solução a tudo.
- Também a fé cresce em comunidade, ou não?
5- Ora com Teresa Exclamações 17,nº 3.
Nenhum comentário:
Postar um comentário