terça-feira, 25 de junho de 2013

Quartas Moradas: Capítulos 3, 1-14

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Prólogo

A situação da qual procede a pessoa que ingressa nas 4M é a de quem conseguiu normalizar a vida de oração, superar a surdez das 1M, o tartamudeio das 2M, normalizar a oração de meditação, atravessar as securas e provas inesperadas, realizar a determinada determinação de não abandonar a oração e pôr a sua confiança em Deus.
- O ingresso nas moradas místicas não está marcado pela mudança de comportamento ético, mas por um novo tipo de relação de gratuidade amorosa da parte de Deus.
- A estrutura do homem na sua capa mais profunda transforma-se num manancial misterioso sob a iniciativa de Deus.
- O papel decisivo do homem é dado pela vontade e o amor. O homem começa a amar de forma nova, experimentando o amor de Deus que se derrama nele.


Estrutura: Capítulo 3.1-14. Oração de recolhimento e quietude.
1-7: Oração de recolhimento infuso e a conveniência ou não do “não pensar nada” (nn.4-7).
8: Oração de quietude, análise do entendimento e vontade nela.
9-14: Efeitos da oração de quietude e avisos.


A ordem lógica1 deveria ser:
Oração vocal, de meditação.
Oração de contentamentos ou recolhimento activo (4M 2, 1-5);
Oração de recolhimento infuso (4M 3, 1-7);
Oração de gostos ou quietude (4M 2, 2.6-10) e seus efeitos (4M 3, 9-14).
Oração de sono de potências. 



Quartas Moradas: Primeiro e Segundo capítulo

Transição para a etapa mística 

Capítulo 1
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Prólogo 
As Quartas Moradas (4M) são de transição entre a fase ascética (Moradas 1 a3) e a mística (Moradas 5 a 7). A pessoa das 4M é um contemplativo incipiente, uma mistura de adquirido e infuso (4M3, 14). Com experiências místicas iniciais, pontuais e de modo intermitente de oração de recolhimento infuso (c.3), uma vontade que acolhe os gostos divinos (oração de quietude da vontade, cap.2) Uma vida que cede a Deus o lugar de primazia. Uma vida de corte menos ascético e mais teologal (o amor posto nas obras e ajudado por Deus). A pessoa das 4M é representada por duas imagens bíblicas (o jornaleiro pago com a moeda do amor, e a esposa do Cântico dos Cânticos convidada ao idílio de amor).


Contexto histórico 
Teresa conta 39 anos quando ingressa nas 4M. Depois da leitura do livro das Confissões de Santo Agostinho e da sua conversão diante do Cristo muito chagado (Quaresma de 1554), tem as experiências narradas nas 4M (em forma breve e intermitente a experiência da representação de Cristo junto a si, um sentimento da presença certa de Deus (V 10, 1). Teresa experimenta uma nova vida interior. 

Estrutura 
4M 1, 1-14: Alvorada mística. 
1-3: Pede luz ao Espírito Santo para exprimir os dons sobrenaturais das 4M. 
4-6: Diferença entre contentamentos e gostos. 
7: A disposição para as 4M é o despertar o amor a Deus. 
8-14. Diferença entre pensamento e entendimento. Domínio da imaginação inquieta. 
4M 2, 1-10. Diferença entre imaginação e entendimento. Os gostos e maneira de alcançá-los. 
1. Os contentamentos espirituais. 
2-6. Gostos espirituais e o símbolo dos dois tanques. 
7. Dificuldades de Teresa para manter um discurso coerente. 
8. Exercício da potência da vontade nas consolações. 
9-10. Disposições para acolher os gostos espirituais. 

Pistas de leitura. Chaves de leitura 

Capítulo 1. Alvorada da etapa mística 

- Porque dá Teresa ao tema das «gostos de Deus» um lugar inicial na sua descrição das Quartas Moradas? 
- Que diferença há entre contentamentos e gostos em 4M 1, 4-6? 
- Como desperta a pessoa para o amor a Deus na transição às 4M 1, 7? 
- Que entende Teresa por «imaginação ou pensamento» e «entendimento» em 4M 1, 8-14? 
- Que conselhos dá Teresa perante a dificuldade de controlar uma imaginação desbordante em 4M 1, 9-14? 




Capítulo2 
Diferença entre imaginação-entendimento 
A disposição para a mística 

- Qual é a relação que Teresa estabelece entre gostos espirituais e os dois tanques de água em 4M 2, 2-6? 
- Porque tem Teresa algumas dúvidas em relação à coerência da sua descrição dos gostos espirituais em 4M 2, 7? 
- Qual é a faculdade humana implicada nos gostos espirituais e de que maneira, segundo 4M 2, 8? 
- Como devemos dispor-nos para alcançar este tipo de oração, de água ou gostos espirituais em 4M 2, 9-10? 

Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 

- Achas que são possíveis experiências de “ contentamentos espirituais” misturados com um pouco de aperto no coração? 
- Já tiveste experiência de algum regalo de Deus que te tenha feito compreender que “pouco aproveita o esforço humano” quando quer qualquer coisa? 
- Já tiveste alguma vez o desejo de poder estar “num ser” nas coisas de Deus, sem estares com as tuas faculdades humanas divididas? 
- Conheces a experiência do gosto interior que deixa o coração dilatado? Ou a experiência da paz interior profunda, embora no exterior haja problemas, pobreza ou ameaças? 
- O “amar muito” dispõe para a entrada na etapa mística. Poderias mencionar algum exercício ou exercícios que possam despertar o amor a Deus, para que a centelhazinha da vontade se acenda cada vez mais? 
- A humildade é outra atitude que dispõe para a mística. Poderias enumerar acções que possam ajudar a crescer na humildade verdadeira? 
- Qual dos conselhos de Teresa te pareceu mais esclarecedor em relação ao domínio adequado do pensamento desbordante?
- A respeito do tanque que simboliza a oração de quietude: - a que corresponde a água, o tanque, o manancial, a nascente ou a profundidade da alma, a enchente do tanque? E que valor dás a esta descrição simbólica da oração de quietude nas 4M? 

Selecção de textos: 
1. Em que consiste o amor a Deus em 4M 1,7: 

“O que mais vos despertar ao amor, isso deveis fazer. Talvez não saibamos o que é amar, e não me espantarei muito; porque não está no maior gosto, mas sim na maior determinação de desejar contentar a Deus em tudo e procurar, tanto quanto pudermos, não O ofender e rogar-Lhe que vá por diante a honra e glória de Seu Filho e o aumento da Igreja Católica. Estes são os sinais do amor…” (4M 1,7). 

2.O outro tanque: 
“Está feita na mesma nascente da água e vai-se enchendo sem nenhum ruído- E se o manancial é caudaloso como este de que falamos, depois de cheio o tanque, segue um grande arroio; não é preciso artifício; nem mesmo se acaba o edifício dos aquedutos, que sempre está correndo dali água… 
A esta outra fonte, vem a água da sua mesma nascente, que é Deus” (4M 2, 3-4). 

3.A acção de Deus em 4M: água e fogo na vontade humana 
“Sente uma fragância interior – digamos agora – como se naquela profundidade interior estivesse um braseiro onde se lançassem olorosos perfumes; nem se vê o lume nem onde está; mas o calor e o fumo perfumado penetram toda a alma e até bastantes vezes – como já disse – participa o corpo” (4M, 2,6).



quarta-feira, 20 de março de 2013

Terceiras Moradas: Segundo capítulo Capítulo II:




Terceiras Moradas: 
Segundo capítulo
Capítulo II: 


Se o primeiro capítulo destas terceiras moradas concluía com a exclamação: Prova-nos, Tu, Senhor, que sabes a verdade, para que nos conheçamos, neste segundo capítulo Teresa de Jesus vai ensinar-nos como prova o Senhor aos que estão nestas moradas (título) para que se conheçam de verdade e não de imaginação.
As pessoas que aqui se encontram ainda não são senhoras das suas paixões: basta um pequeno empurrão, causado pelas contrariedades da vida, para que todo o seu “concerto” caia ao chão. Falta-lhes liberdade de espírito, dirá Teresa; caminham demasiado devagar, cheias de temores e prevenções. E, lembrando-se das suas andanças pelos caminhos de Espanha, pergunta: Parece-vos, filhas, que se indo de uma terra a outra pudéssemos chegar em oito dias, seria bom andar um ano por ventos, neves, chuvas e maus caminhos? Não valeria mais passa-lo de uma vez?
Santa Teresa conhece muito bem por experiência estas 3M (3M 2,7), e por isso avisa aos que vão com tanto senso do perigo que correm: é muito fácil voltar atrás, estamos muito perto das 1M, se não se esquecem das suas concertadas razões e dão o salto confiando unicamente no Senhor. É a prova do amor, humildade e obediência que lhes porão asas nos pés.


Pistas de leitura

1- Enganos de gente aproveitada (3M 2, 1-3)
Não há pior surdo do aquele que não quer ouvir, diz o refrão, e assim são, ao pé da letra, estas pessoas que Teresa chama pessoas concertadas.
Qualquer inquietação, inclusive a secura na oração, fazem dela um drama e “sacralizam-na”, pois é por Deus que as sentem e assim não vêm a entender que é imperfeição. Dar-lhes conselho não remedeia: sabem tudo, há muito que começaram o caminho espiritual e podem ensinar outros. Canonizam em seus pensamentos estas coisas, e assim quereriam que os outros as canonizassem.

2- As “provas dos bons”
Teresa de Jesus põe uns exemplos gráficos para que entendamos de que provas se trata. Afectam ao que há de mais humano e mais terra-a-terra: o dinheiro e a imagem (3M 2, 3-4); são “coisinhas” mais ou menos grandes que a vida traz num ou noutro momento.
É interessante notar que, para Teresa, também na prosperidade há um perigo a evitar: o afã de ganhar mais, licitamente, embora seja para o dar a outros. Uma pessoa que tome seriamente o seu seguimento e queira chegar às moradas onde habita o Rei deve guardar-se da ambição, sob qualquer pretexto, e da falsa segurança que dá o dinheiro. No fundo, trata-se do Evangelho: “não podeis servir a Deus e ao dinheiro”.
Com ironia, dirá Teresa que estas boas pessoas quereriam a todos tão concertados como eles trazem suas vidas, e praza a Deus que não pensem que a pena que têm é pela culpa alheia e a façam meritória em seu pensamento (3M2,5)

3- «O hábito não faz o monge»
Na vida ordinária, vamos ter múltiplas ocasiões de ver se estamos tão atados como os habitantes das 3M. O importante não é levar um hábito, mas procurar exercitar as virtudes e render a nossa vontade à de Deus em tudo (3M 2,6). De novo, o critério é o Evangelho (e não podia ser de outro modo!): que não se faça em nada a nossa vontade mas a Sua.

4- “Não está ainda o amor para pôr de parte a razão”.
Esta é a chave: o amor que prevalece nestas pessoas é o amor a si mesmas e não a Deus. É precisa uma forte sacudida e uma determinada determinação para sair deste estado: Deixemos a nossa razão e temores nas Suas mãos [nas de Deus] … Humildade, que é o unguento de todas as feridas: é a receita de Teresa, pois este caminho faz-se depressa com profunda humildade; aqui, creio, que está o dano das que não passam adiante. A perfeição não está nos gostos, mas em quem ama mais – conclui satisfeita (3M 2,10).

5- As boas companhias.
Boas, sem ironia, porque para avançar para as 4M é muito boa ajuda tratar com quem já está desenganado das coisas do mundo, do que não vale nem enche a alma, e assim aproveita tratar com quem já conhece o mundo para nos conhecermos (3M 2, 12). Anima muito – aconselha Teresa – ver que é possível, vendo-o noutros o que a nós nos parece impossível, e de novo acode ao remédio da obediência – ter a quem recorrer para não fazer em nada a sua vontade, quer dizer, deixar-se discernir para lutar contra a auto-suficiência que nos cega.

6- Alguns conselhos de ouro:
- Guardar-se das ocasiões pois não estão ainda tão fortes que não possam voltar atrás com facilidade.
- Não bisbilhotar vidas alheias nem julgar o próximo com facilidade: Olhemos as nossas faltas e deixemos as alheias (3M 2, 13).
- Não querer que todos vão pelo mesmo caminho.
- Cuidado, porque, sob capa de bem, podemos cometer muitos erros (ibid.).


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…

1. Como reagimos aos contratempos ordinários da nossa vida? Deixamo-nos abater pelas pequenas coisas? Reler 3M 2, 1-7.
2. “Procurar ajuda” De novo, como já tinha feito na Livro da Vida (cf. V 7, 20-22), Teresa lembra-nos a importância do grupo para o cristão – os cinco que, ao presente, nos amamos em Cristo (cf. V 16, 7). Lembra que classificou de “loucos por amor” (V 16,6) aqueles que estão dispostos a arriscar mil vidas por Cristo e se apoiam uns aos outros para consegui-lo (cf. V 34, 16). – Como te sentes no teu grupo, na tua comunidade paroquial? – Ajuda-te a viver com mais entrega? – Como poderias progredir no acolhimento, na aceitação do contraste e o conselho dos outros?
3. Compara e medita: V 20, 26-28 e 3M 2, 4-6-
4. Reconheces-te em alguma das “pessoas concertadas”? Lê novamente 3M 2, 13 e V13.
5. Bendiz a Deus pelas obras que realiza nos outros (2M 2, 11) e louva-O com este belo texto de Vida 16, 4-8.A santa loucura celestial é o verdadeiro antídoto para pessoas concertadas:

E pois que ao escrever isto não estou fora desta loucura celestial – de que tão sem méritos meus e por Vossa bondade e misericórdia me fazeis mercê – eu Vos suplico, meu Rei, que tenhais agora por bem que todos aqueles com quem eu tratar estejam loucos de Vosso amor ou permiti que eu não tenha já em conta coisa que seja do mundo, ou tirai-me dele.
Não pode já, Deus meu, esta Vossa serva sofrer tantos trabalhos como tem por se ver sem Vós e, assim, se há-de viver, não quero descanso nesta vida, nem que Vós lho deis. Quereria já esta alma ver-se livre do corpo: o comer, a mata; o dormir, a atormenta; vê que se lhe passa o tempo da vida vivendo em regalos e que nada já a pode regalar afora Vós. Parece que vive contra a natureza, pois já não quereria viver em si, senão em Vós…

Suplico a V. Mercê que sejamos todos loucos por amor d’Aquele a quem por nós assim chamaram. Diz V. Mercê que me quer bem, pois em dispor-se para que Deus lhe faça esta mercê e quero eu que mo mostre, porque vejo muito poucos que os não veja com senso demasiado para o que lhes diz respeito. Bem pode ser que o tenha eu mais que todos…
Desengane-me com verdade, que se usam muito pouco estas verdades (V 16, 4-5).


Terceiras Moradas: Primeiro capítulo

                                  


Terceiras Moradas: Primeiro capítulo
Quantas figuras bíblicas encontramos nestas moradas! O protagonista do salmo 111, David, Salomão, o apóstolo São Tomé, a Virgem Maria e…o paradigma do habitante das Terceiras Moradas: o jovem rico (Mt 19, 16-22).
O modelo destas 3M não pode ser senão este “mancebo do Evangelho”, porque estas são as moradas dos bons e “muitíssimo bons”, mas - sempre há um “mas”- que não são capazes de ir mais além das suas obrazitas (3M 1,6), que tudo têm pesado, medido, equilibrado, arranjado…concertado, como diria Teresa.

São pessoas estupendas, “que tudo têm cumprido desde a juventude”, de comunhão diária, de grupo paroquial, catequistas e até consagrados, daqueles em quem Jesus Se compraz e olha com carinho. Mas, quando escutam aquilo de “vende o que tens… e depois vem e segue-Me”, voltam as costas com tristeza. “Não, não está ainda o amor para pôr de parte a razão” (3M 2,7).
- Seremos nós por ventura um destes?


Pistas de leitura

1 – Olhai muito, filhas, para algumas coisas que aqui vão apontadas, ainda que atabalhoadas (cf. 3M 1,9). Capítulo 1 das 3M:
§ Teresa felicita-nos: se chegámos a estas formosas moradas somos Bem-aventurados, vencemos os combates e a com a nossa perseverança aqui estamos: “se não volta atrás leva caminho seguro na sua salvação” (3M 1,1). Não é possível um começo melhor, embora em breve nos mostre o exemplo de David e Salomão, e nos avise da falta de segurança em que nos encontramos. Nestas moradas ainda há mais perigo do que nas primeiras, porque aqui já nos julgamos alguém, somos gente dela, nas nossas atitudes, que até parece que nos é devido e não nos pagam” (3M 1-5).
§ As bem-aventuranças teresianas (3M 1,2). Temos aqui uma oração que convém rezar com Teresa.
§ Teresa recorda (3M 1, 3-4). Diz o P. Tomás Álvarez que Teresa de Jesus evoca aqui a sua própria história, a lembrança agridoce da sua passagem pelas 3M por volta dos seus trinta anos, que durou longo tempo e que descreve com dramatismo em V 8, 11-12. É estimulante para nós que, nesta experiência da própria fragilidade, nos acompanhe a experiência de Teresa.
§ Teresa oferece-nos um espelho (3M 1,5-6). Parece que há muitos orantes que chegam a esta morada, mas não tantos que passem adiante… Temos aqui um retrato-robô daqueles que muito desejosos de não ofender a Deus, se guardam de todo o pecado até mesmo venial. Amigos de penitência. Com suas horas de recolhimento. Gastam bem o tempo. Exercitam-se em obras de caridade com os próximos. Muito concertados no falar e no vestir e no governo de casa.
É uma linda disposição, nos dirá Teresa, mas há uma falta de generosidade, como a do jovem rico, um apego excessivo á própria vontade e às próprias ideias. Em resumo: é a adolescência espiritual.
§ Um remédio muito teresiano (3M 1,7): Ó humildade, humildade! O problema é a falta dela; falha o conhecimento próprio. Prove-nos o Senhor, pois bem o sabe fazer! O amor tem de ser provado com obras, assevera Teresa de Jesus: Deus olha à determinação da nossa vontade!
Provai-nos Vós, Senhor, que sabeis as verdades, para que nos conheçamos!

Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…
1. Que te sugeriu o texto? Reconheces-te, de alguma maneira, nestas pessoas descritas?
2. Diz Teresa de Jesus que este é um estado para desejar… Para passar mais adiante talvez tenhamos que deixar Deus, e os outros, romperem os nossos esquemas e seguranças. Medita e partilha Caminho de Perfeição 32,8 neste contexto.
3. Ora com Teresa: - Que podemos fazer por um Deus tão generoso… (3M 1,8)?
4. Embora não seja com a obra, podemos oferecer ao Senhor a vida com a determinação da vontade. Podes orar com a poesia: “Vossa sou, para Vós nasci”. 

quinta-feira, 14 de março de 2013

Segundas Moradas Capítulo único


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Para entrar nas segundas Moradas, Teresa adverte-nos de que teremos de perseverar na luta, e distingue entre as almas que já começaram a ter oração e compreendem quanto importa continuar para a frente, e as que não se dão conta do perigo em que estão, sempre distraídas no exterior, sem ouvirem o chamamento do Senhor.

Pistas de leitura 

Teresa começa por nos dizer “quais serão as almas que entram nas segundas moradas e o que fazem nelas” (2M 1): 
Começaram a ter oração e sabem quanto importa continuar para a frente. 
Compreendem que têm de deixar as ocasiões. 
Ouvem os chamamentos que lhes faz o Senhor através de pessoas boas, livros, sermões, doenças, etc. 

E uma lista dos impedimentos que vamos encontrando: 
- A estima que nos têm no mundo. Os parentes e amigos. 
- A saúde nas coisas de penitência. 


Para continuarmos para as segundas Moradas vão-nos ajudar: 

A razão que nos “representa o engano que é pensar que tudo isto vale alguma coisa em comparação do que pretendemos” (2M 4) 

A fé que nos ensina o que nos cumpre fazer (Ibid.). 

A memória que nos recorda em que vai parar tudo isso (Ibid.). 

A vontade que nos inclina a amar Jesus, o bom Amador (Ibid). 

E o entendimento que nos diz que não podemos ter melhor amigo que o Senhor (Ibid.). 

Para isso, são-nos pedidas umas atitudes fundamentais como: 

A esperança: “não vos desconsoleis, ainda mesmo que não respondais logo ao Senhor. Bem sabe Sua Majestade aguardar muitos dias e anos” (2M 2) 

A perseverança: “Ah! Senhor meu! Aqui é mister a vossa ajuda, pois, sem ela, não se pode fazer nada. Por vossa misericórdia não permitais que esta alma seja enganada para deixar o que começou” (2M 6) 
Desde o princípio, não pretender regalos na oração, mas aceitar a secura abraçando-nos à cruz de Jesus. Se o Senhor nos der algum gosto, agradecê-lo. 
Nesta luta, iremos descobrindo o grande mal que nos faz andar derramados no exterior, sem podermos sossegar no nosso interior e procurando fora a paz que não vivemos em nós próprios. 
Saberemos também que começar a recolher-nos não se consegue à força de braços, mas com suavidade e tratando com pessoas experimentadas. Finalmente, Teresa dir-nos-á que: “pensar que havemos de entrar no Céu e não entrar em nós, conhecendo-nos e considerando a nossa miséria e o que devemos a Deus e pedindo-Lhe muitas vezes misericórdia, é desatino” (2M 11). 


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar… 

1- Perguntando-nos sinceramente diante do Senhor: - pode mais em nós o seu chamamento ou estamos demasiado dependentes de contentamentos e opiniões exteriores? 
Certamente saberemos fazer uma lista de tudo aquilo que nos tira liberdade para penetrarmos cada vez mais no nosso interior. 

2- Nas ocasiões em que temos de nos fazer fortes, que é o que mais ajuda a seguir em frente? A razão, a fé, a vontade, etc…? 
3- Oremos com as palavras de Teresa: “não vos desconsoleis, ainda mesmo que não respondais logo ao Senhor. Bem sabe Sua Majestade aguardar muitos dias e anos” (2M 3). 
4- Façamos memória agradecida pelo amor de Deus que “é muito bom vizinho e tão grande a sua misericórdia e bondade que, mesmo estando nós em nosso passatempo, negócios, contentamentos e bagatelas do mundo, e até caindo e levantando-nos em pecados… com tudo isto, tem em tanto este Senhor nosso que O amemos e procuremos sua companhia, que, uma vez ou outra, não deixa de nos chamar para que nos acerquemos a Ele…” (2M 2) 
5- Finalmente, contemplemos Jesus acompanhados com o seguinte texto: “O mesmo Senhor nos diz: «Ninguém subirá a meu Pai, senão por Mim… e quem Me vê a Mim vê a meu Pai». Pois se nunca olhamos para Ele, nem considerarmos o que Lhe devemos e a morte que sofreu por nós, não sei como O podemos conhecer nem fazer obras em seu serviço. Porque a fé, sem elas, e sem irem unidas ao valor dos merecimentos de Jesus Cristo, nosso Bem, que valor pode ter? E quem nos despertará a amar este Senhor?” (2M 11).



segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Primeiras Moradas: Capítulos 1-2


Primeiras Moradas: Capítulos 1-2




Desde o cume da sua oração, Teresa oferece-nos a sua visão de Deus e do homem com o fim de centrar a nossa vida espiritual na relação com Deus, a que Teresa chama oração, isto é, amizade.
Partindo do símbolo do Castelo, é-nos dito que cada um de nós é como um castelo, no interior do qual está a alma, que a porta para entrar é a oração, ensinando-nos a dar os primeiros passos. 


Pistas de leitura 

Teresa convida-nos a considerar a nossa alma como «um castelo todo ele de um diamante ou mui claro cristal», onde há muitos aposentos ou moradas e no centro de todas estas tem a mais principal onde se passam as coisas mais secretas entre Deus e alma (1,1.3)
Anima-nos a não nos cansarmos em querer compreender a formosura deste castelo, a entender e a saber quem somos, os bens que possuímos e quem nos habita (1,2) Quer que compreendamos as mercês de Deus, sabendo que é possível comunicarmos com Ele, Bondade e Misericórdia (1, 3). 
Ganhar consciência de que esta dignidade e formosura nos vem de sermos feitos à imagem do nosso Criador (1, 1).
Teresa diz que, para poder entrar, a porta é a oração, advertindo com Quem falamos e o que pedimos (1, 7), avisando-nos que «vai muito de estar a estar». 

a) Há almas que se ficam pela cerca e que não se lhes dá de entrar (1, 5), tão doentes e dispostas a permanecer em coisas exteriores que não há remédio nem parece que possam entrar dentro de si (1,6)!

b) Outras entram no castelo e, embora estejam muito metidas no mundo, têm bons desejos… encomendam-se a Nosso Senhor e consideram quem são… cheias de mil negócios… e o coração se lhes vai para onde está o seu tesouro. Propõem algumas vezes, para consigo mesmas, desocupar-se… (1, 8)
As primeiras (a), sendo de natureza tão ricas e podendo ter a sua conversação com Deus, por não voltarem a cabeça para si mesmas, não têm remédio (1, 6); as segundas (b), embora entrem nas primeiras dependências, entram com tantas sevandijas, que não lhes deixam ver a formosura do castelo nem sossegar (1, 8). 
No 2º capítulo, Teresa, continua a pôr-nos perante o mistério do mal (2, 1), sublinhando a desordem que produz no nosso interior ao frustrar a nossa relação com Deus, embora Ele continue a habitar-nos (1, 3).
Teresa quer evitar que percamos o sentido do pecado, que nos faz perder o sentido da realidade, podendo errar o caminho e não chegarmos ao mais profundo do nosso encontro com Deus. Agora faz-nos voltar ao castelo advertindo-nos que:
«as coisas da alma devem-se considerar com amplidão, largueza e grandeza, e nisto não há demasia, pois tem maior capacidade do que nós podemos considerar, e a todas as partes dela se comunica este Sol…(2,8). 

Continua com a importância do autoconhecimento e como este se consegue (2, 9), ensinando-nos à continuação onde se encontra a verdadeira humildade (2, 11). 
Fazendo-nos ver onde nos encontramos no princípio deste caminho, faz-nos conscientes de estarmos numa situação de luta e pobreza pessoal, aconselhando-nos como poder avançar para as segundas moradas (2,14). 
E termina lembrando-nos em que consiste a verdadeira perfeição. «amor de Deus e do próximo» (2, 7). 


Para reflectir, rever a vida, interceder, agradecer, contemplar…

1. Relendo e saboreando como Teresa descreve a nossa realidade interior desde a sua visão positiva: - Acreditamos nisto realmente? Sabemo-nos verdadeiramente habitados pelo próprio Deus?

2.Avançamos no caminho do conhecimento próprio ou já sabemos tudo por nós próprios? 

3. Coloquemo-nos em silêncio perante o olhar de Deus: experimentamos como Ele nos descobre a nossa verdade?
Agradeçamos sinceramente o seu convite a adentrarmo-nos cada vez mais ao seu encontro. 

4. Sejamos conscientes da nossa fraqueza e, sem nos desanimarmos, peçamos-Lhe que nos ajude a nos libertarmos das nossas ataduras.

5. Teresa recorda-nos que todos estamos chamados à comunhão com Deus e que Ele nos trata cada um livremente.
Oremos para que toda a pessoa possa viver esta comunhão e alegremo-nos pelos que têm a graça de gozá-la. 

6. Entendendo que a perfeição verdadeira é amor de Deus e dos nossos irmãos, contemplemos Cristo para aprendermos a conhecer o verdadeiro Amor 


BICHO DA SEDA


bicho da seda

Em pleno coração do livro do castelo interior e dentro das quintas moradas, Santa Teresa descreve a transformação que experimenta a pessoa na oração, com um símbolo muito belo: o bicho da seda, o qual se fecha no seu casulo interior, e aí “com as suas boquitas vão fiando a seda, e fazendo uns casulos muito apertados onde se fecham… E morre este bicho, que é grande e feio, e sai do mesmo casulo uma borboleta branca muito bonita”.


Esta imagem do bicho da seda serve para que Teresa expresse melhor a mudança e a transformação da pessoa, como mistério pascal de morte e ressurreição.
No desenvolvimento desta transformação, como no processo em que o bicho da seda se metamorfoseia em borboleta, é muito importante a ação do Espírito Santo que vai ajudando nessa disposição e no nosso trabalho para não ficarmos pelo meio do caminho.

Podemos agora visualizar os diferentes elementos contidos no processo desta imagem: 
Semente: São uns bagos, como grãos de pimenta, que se convertem em larvas.
A folha da amoreira: É o primeiro espaço onde se desenvolvem, é o alimento.
Ambiente: Calor, elemento que necessita a semente para viver,  é a graça do Espírito Santo. 

Bicho da seda: É cada um de nós a partir  da perspectiva da transformação profunda. 
Tecer o casulo ou a “casa”: é um convite para construir a própria habitação, a viver a interioridade. 
Fabricar a seda, lavrar a seda: Cristo é a morada. Vive dentro de cada um. A seda é o resultado das maravilhas que Deus faz através de nós.

Trabalhos: São todos os esforços e ações que temos que fazer para corresponder à graça, para não vivermos superficialmente.

A borboleta: equivale ao “homem novo”, é o fruto da ação transformadora de Deus.
É graça, libertação.

Este símbolo é a síntese da história de todo o homem nascido para ter asas e elevar-se.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

AS MORADAS ou CASTELO INTERIOR Guião doutrinal




Eis aqui o terceiro “guião de leitura” para nos acompanhar na leitura anual de Santa Teresa que, de acordo com o programado, este ano vai centrar-se mo Livro d’As Moradas ou Castelo Interior.
Diferentemente de outros anos, desta vez, desta vez só enviamos um guião, o doutrinal. Tomámos esta decisão tendo em vista que muitas comunidades usam para a leitura comum e para a pastoral, as fichas que se publicam na página Web do Centenário, e pareceu-nos melhor concentrar o trabalho nelas e não oferecer outro guião que possa ser de menor utilidade
As comunidades que não disponham de internet ou que não possam aceder a ela frequentemente, podem solicitar aos Superiores Maiores que lhes enviem ditas fichas, ou então pôr-se em contacto com a Comissão do Centenário através da página Web, para que lhas enviemos a uma direcção de correio electrónico (não nos é possível fazê-lo por correio postal).
Empreendamos, pois, juntos, esta viagem apaixonante rumo ao castelo de diamante ou mui claro cristal…
 
Comissão preparatória OCD do Vº Centenário do Nascimento de Santa Teresa
O CASTELO INTERIOR ou AS MORADAS 

de SANTA TERESA.

Mandato de escrever

O livro d’As Moradas ou Castelo Interior de Santa Teresa é habitualmente considerado como a sua melhor obra. Mais do que história, este livro contém biografia, ou melhor, autobiografia. Em diálogo com Graciano, falando do livro da Vida, disse-lhe ele: “Faça memória do que se lembrar e de outras coisas, e escreva outro livro, e diga a doutrina em geral, sem nomear a quem aconteceu tudo aquilo que nele disser”.
Este “outro livro” foi o Castelo Interior. A própria autora, contente com a sua obra, dá a preferência a este – as Moradas, sobre o outro – a Vida. E, usando termos de ourivesaria, embora para ela o livro da Vida seja uma jóia, o Castelo Interior é mais precioso e com mais delicados esmaltes e lavores, ou dito de outra maneira por ela própria: “ A meu parecer, avantaja-se-lhe o que escrevi depois, embora frei Domingos Báñez diz que não está bom; pelo menos tinha mais experiência do que quando o escrevi”.
O mandato de escrever As Moradas veio-lhe de três lados: do padre Graciano, do doutor Velázquez e do “vidreiro” Maior: Cristo Jesus que, por outra parte, era o seu “livro vivo”.
As condições de saúde que a Madre atravessava eram muito penosas, “com ruído e fraqueza tão grande de (cabeça) que mesmo os negócios forçosos escrevo com pena”. A situação da Ordem era de grande risco e a própria Teresa encontrava-se confinada em Toledo, a modo de cárcere. Mas a fortaleza desta mulher dá-lhe o equilíbrio necessário para poder escrever amplamente. E a que levou acabo tantas fundações sem saúde e no meio de tantas contradições, vai agora construir este seu castelo com a mesma força de vontade.
 

Tempo de escritura, autógrafo, destinatárias

A hora da primeira pedra e da última é ela própria quem no-la revela: “E assim começo a cumpri-la hoje, dia da Santíssima Trindade, ano de 1577, neste mosteiro de S. José do Carmo em Toledo, onde estou presentemente” Isto no prólogo. E, na conclusão do livro: “Acabou-se isto de escrever no mosteiro de São José de Ávila, no ano de 1577, véspera de Santo André, para glória de Deus, que vive e reina para sempre sem fim, amen” (7M, conclusão 5).
Um total de seis meses menos dois dias, desde que começou a escrever até que lhe pôs ponto final. Fala-nos, pelo menos duas vezes, da interrupção da escrita, “porque os negócios e a saúde me fazem deixá-lo na melhor altura” (4M 2,1). E noutro lugar dirá: “já passaram quase cinco meses desde que comecei até agora; e, como a cabeça não está para o tornar a ler, tudo deve ir desconcertado, e talvez diga algumas coisas duas vezes” (5M 4,1). Volta ao mesmo manuscrito e termina a obra a 29 de Novembro.
E, concluído o livro, dá “por bem empregado o trabalho, embora confesso que foi bem pouco”. O autógrafo das moradas encontra-se no mosteiro das carmelitas descalças de Sevilha desde Outubro de 1618. Em 1622, foi levado em procissão pelas ruas de Sevilha por ocasião dos festejos pela canonização da autora. E a última e mais prolongada saída do manuscrito até Roma teve lugar em 1961, onde foi devidamente restaurado pelo “Istituto Ristauro Scientifico del libro” do Vaticano e o “Istituto di Patologia del libro” de Itália. Voltou a Sevilha em 1962 e ali se conserva no convento das Descalças, num indescritível estojo relicário: as muralhas de Ávila convertidas em castelo para abrigar e custodiar o autógrafo do Castelo Interior. Esta obra deve-se à ideia e solicitude do então Geral da Ordem, Padre Anastácio Ballestrero
As primeiras destinatárias são as suas monjas, como diz nesta espécie de dedicatória: “JHS. Este tratado, chamado Castelo Interior, escreveu Teresa de Jesus, monja de nossa Senhora do Carmo, para as suas irmãs e filhas, as monjas carmelitas descalças”.
Destinatário da obra é também todo o fiel cristão, candidato à santidade desde o seu baptismo e por ele.

Visita ao Castelo

É a própria autora a que nos vai guiando a partir de uma das suas primeiras confissões. Está com a pena na mão pensando como poderá começar a escrever, e “ofereceu-se-me o que agora direi para começar com algum fundamento. É considerar a nossa alma como um castelo todo ele de um diamante ou mui claro cristal, onde há muitos aposentos, assim como no Céu há muitas moradas (Jo 14,2). Que, se bem o considerarmos, irmãs, não é outra coisa a alma do justo, senão um paraíso onde Ele disse ter Suas delícias” (Prov 8, 31) ” (1M 1,1).
Já, desde aqui, sem nenhuma complicação, compreendemos qual, ou melhor, quem é para ela o castelo interior: a pessoa humana, e vemos como se vai deixando iluminar, por esse par de textos bíblicos, de João e Provérbios.
Para organizar a leitura ou estudo de obra tão importante como esta, para assaltar este Castelo (passe a expressão), publicaram-se já há alguns anos, “um grande trabalho em que se analisam com lupa os núcleos básicos do simbolismo teresiano, os eixos temáticos de cada uma das moradas, o itinerário léxico da interiorização, o caminho para a construção simbólica da própria interiorização” (Monserrat Izquierdo Sorli).
Este tipo de estudo e de leitura não resulta fácil à maioria dos leitores em cujas mãos cai o livro d’ As Moradas. Mais ao alcance da mão estão uns esquemas muito simples, mas muito compreensíveis. Nesta elaboração entram elementos doutrinais básicos, em que se interrelacionam necessariamente os dois protagonistas: Deus e o homem. Deus que vive e actua e Se comunica dentro. O homem (a alma) como cenário e protagonista da aventura espiritual. E a oração, que é a ponte de comunicação entre Deus e a alma. Daqui brota a ideia, o conceito de “moradas”.
Teresa divide a obra do Castelo em sete moradas, mas adverte: “não considerem poucos aposentos, senão um milhão deles” (2M 2,12), e mais claramente: “Embora não se trate senão de sete moradas, em cada uma destas há muitas: por baixo, por cima. Dos lados” (7M conclusão 3).
Prescindindo da compreensão do Castelo em que se encontram e se vêem e se podem visitar e percorrer os diferentes aposentos, estâncias, salas, moradas, devemos ter sempre presente que a alma é a que tem em si mesma as diversas ou diferentes moradas, as leva consigo e é considerada como repartida em sete moradas, sem prejuízo de que essas sete se convertam em setenta vezes sete, quer dizer, em inumeráveis.
Em Fundações 14, 5, encontra-se uma frase que ilumina bem este facto: “Quanto menos tivermos na terra, mais gozaremos naquela eternidade onde as moradas são conforme ao amor com que imitámos a vida do nosso nom Jesus”. Esse mais além tem-no ela bem presente no momento em que começa a escrever: “Onde há muitos aposentos, assim como no Céu há muitas moradas” (1M 1,1). Ouve-se, aqui, o eco da passagem evangélica, embora sem mencioná-la: “Na Casa de meu Pai há muitas moradas” (Jo 14,2)
O percurso do Castelo torna-se mais fácil e prazenteiro da mão da autora. Lido devagar o prólogo, o leitor deixe-se levar pelos títulos dos 27 capítulos que compõem o livro. A Santa tem uma habilidade especial para sintetizar nesses epígrafes o que quer dizer. Além disso, como parece certo que os títulos estão escritos depois de redigido o texto, resulta dupla a habilidade sintetizadora e esclarecedora da autora.
Terminada a leitura dos 27 títulos, leia-se com atenção a Conclusão, particularmente os nn. 2 e 3, onde a Madre lança, uma vez mais, critérios de vida e de leitura, que foi semeando ao longo do livro.
Outro método bastante simples para ir fixando na mente a doutrina do Castelo interior consiste em atender à substância bíblica incluída em textos, tipos, personagens, motivos bíblicos.
Como exemplo, pode ver-se, nas Segundas Moradas, onde se encontram: 1. Textos: “Quem anda no perigo, nele perece” (Si 3,26); “ não sabemos o que pedimos” (Mt 20,22); “sem a sua ajuda nada podemos fazer” (Jo 15,5); “a paz esteja convosco” (Jo 2,19.21). 2. Tipos bíblicos: O filho pródigo, perdido e comendo manjar de porcos (Lc 15,16); e os soldados de Gedeão quando iam para a batalha (Jz 7, 5-7. 16,22). 3. Textos e também motivos: “Ninguém subirá ao Pai senão por Mm” (Jo 14, 6); “quem Me vê a Mim, vê Meu Pai” (Jo 14,19).
O fio condutor é bem fácil de seguir e muito útil ao longo de todas as moradas. Não podemos esquecer tampouco uma coisa tão frequente na Santa escritora: o mundo dos símiles, exemplos ou comparações, que, na sua pedagogia, a assemelham tanto ao divino Mestre. Um dos exemplos generalizados é a comparação do castelo: 1M 1,3. Este símile não é exclusivo (nem no seu espírito nem na sua pena) d’As Moradas: também o usou no Caminho (CV 28,9-12; CE 48, 1-4); no Caminho, não usa a palavra ”castelo”, mas “palácio”; no entanto, a substância é a mesma. Outro exemplo de comparação- e acaso a melhor – é a do bicho-da-seda: 5M 2, 1-10.
O tema, ou melhor, a realidade da oração, está presente em todo o Castelo como fio condutor. A presença da oração já a deixa bem claramente proposta em 1M 1,7: “Tanto quanto eu posso entender, a porta para entrar neste castelo é a oração e reflexão, não digo mais mental que vocal; logo que seja oração, há-de ser com consideração; porque naquela em que não se adverte com Quem se fala e o que se pede e quem é pede e a Quem, não lhe chamo eu oração, embora muito meneie os lábios”.
Não podemos perder de vista esta afirmação, contando com a evolução que se vai seguindo: oração rudimentar, como primeiros ensaios; meditação, um simples olhar, estar na presença de Deus; recolhimento infuso, quietude, gostos; oração de união. Deus no fundo da alma; formas extáticas, visões, locuções, êxtases, ferida de amor; ânsias de eternidade; contemplação perfeita. Da conjunção de todos estes elementos que vamos assinalando, bem saboreados, irá surgindo no leitor, além do gosto mental, a compreensão da doutrina teresiana.
Alguém, desde a França, escreveu há tempos, embora não a propósito da doutrina teresiana: “A oração é o primeiro de tudo. Não é o essencial: o essencial é a caridade, que resume em si mesma a perfeição, Deus mesmo. Mas a oração é o primeiro”. Por isso, escreveu José Vicente Rodríguez com toda a razão: “Partindo da realidade da graça e do amor, que fazem que a alma seja agradável a Deus, que seja o paraíso onde Ele Se deleita (1M 1,1), as moradas vão-se convertendo na base do amor, virão a ser os diferentes graus de amor da alma, visto que ”o aproveitamento da alma não está em pensar muito, mas em amar muito” (F 5,2), e também “para subir às moradas que desejamos, não está a coisa em pensar muito, mas em amar muito” (4M 1,7). Este amor não é exclusivo mas inclusivo de outras actividades, outros exercícios, e assim resulta que a alma estabelecida em amor empregar-se-á, por exemplo, no conhecimento próprio e no exercício da humildade: as primeiras moradas (1M 2, 8-9). Dar-se-á também diversificação segundo as diferentes mercês recebidas de Deus (1M 1,3). Isto vê-se bem claro na leitura seguida da obra teresiana, sendo a oração de quietude algo típico e fundante, por exemplo, das Moradas Quartas; das Moradas Quintas a oração de união; das Sextas o desposório espiritual e das Sétimas o matrimónio espiritual”.
Para compreendermos plenamente como leva a Santa toda a sua carga doutrinal, aconselhamos a ler com toda a atenção o último capítulo de todo o livro: (7M c. 4). Aqui, dá a impressão de que a Madre quer aterrar nos fundamentos mais sólidos da vida cristã: o amor fraterno e a configuração com Cristo. O Castelo interior é, sem dúvida, um esplêndido manual de santidade.
Como ajudas e pontos de referência no percurso do Castelo, também resulta útil imprimir na memória alguns pontos nos quais a Madre condensa a doutrina que vai estendendo os seus tentáculos ao longo de todo o livro. Bastarão alguns exemplos: Grandeza, dignidade, capacidade, formosura da alma humana: 1M 1, Presença total, natural e sobrenatural de Deus na alma: 5M 1,10. Consciência teresiana da diversidade de almas:1M 1,3; 5M 3,4. Fabricar cada um a sua morada em Deus: 5M 2, título e corpo do capítulo. Ser de veras espirituais: 7M 4,8. Não ficarem anãos: 7M 4,9. Ser plenamente realistas: 7M 4, 14. Não pôr medida às obras de Deus: 6M 4,12.
E, como capítulo imprescindível sobre Cristo Jesus, deve ler-se 6M 7, cujo título reza assim: “Diz quão grande erro é não se exercitar, por espiritual que seja, em trazer presente a humanidade de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, e sua sacratíssima Paixão e vida, e a Sua gloriosa Mãe e os santos. É de muito proveito”. Trata-se de um capítulo paralelo a Vida 22.

Concluindo 

Em 6M 10,3, a Santa surpreende-nos com a identidade e, ao mesmo tempo, com a diversidade que assinala nesta passagem: “Façamos agora de conta que Deus é como uma morada ou palácio muito grande e formoso, e que este palácio, como digo, é o mesmo Deus”. Partindo destas palavras, chega-se imediatamente àquilo de “sede perfeitos como vosso Pai Celestial é perfeito” (Mt 5,48). Aqui, diríamos: sede castelos formosos como o vosso Pai Celestial o é.
O famoso Catecismo holandês apresenta assim aos crentes de hoje esta obra teresiana: “Santa Teresa escreveu um livro em que a alma está representada por um Castelo com sete moradas. Morada após morada, chega-se à sétima onde habita Deus, quer dizer, Cristo. A sua presença percebe-se em todo o Castelo, mas ao chegar a alma ao centro, imersa na própria realidade, sente-se toda invadida pelo sereno sentimento de que Deus está nela. A alma vive dentro da realidade terrena, que se apresenta magnífica aos seus olhos, pois compreende que Deus é o coração inefável de toda a realidade”.
Na Positio para o Doutoramento da Santa, encontra-se, como peça principal, o Relatório do advogado da causa. Para defender a altura da eminente doutrina da santa doutoranda, oferece da seguinte maneira uma espécie de resumo d’As Moradas. 
Esta “é a principal obra teresiana e mesmo – segundo alguns- de toda a mística cristã […]. O livro divide-se em sete partes ou moradas, das quais cada uma tem vários capítulos, excepto as segundas moradas, que tem um único capítulo.
As Primeiras Moradas (2 capítulos) são as almas que têm desejos de perfeição, mas ainda estão metidas nas preocupações do mundo, das quais devem fugir e procurar a soledade.
As Segundas Moradas (1 capítulo) são as almas com grande determinação de viver em graça e que se entregam, portanto, à oração e a alguma mortificação, embora com muitas tentações por não deixarem de todo o mundo.
As Terceiras Moradas (2 capítulos) são para as almas que exercitam a virtude e a oração, mas pondo nisso um amor dissimulado a si mesmas. Precisam de humildade e obediência.
As Quartas Moradas (3 capítulos) são já o começo das coisas “sobrenaturais”: a oração de quietude e um início da união. Os frutos não são ainda estáveis: por isso, as almas devem fugir do mundo e das ocasiões.
As Quintas Moradas (4 capítulos) são já de plena vida mística, com a oração de união que é sobrenatural e dá-a Deus quando quer e como quer, embora a alma se possa preparar. Os sinais verdadeiros desta união é que seja total, que não falte a certeza da presença de Deus e que sucedam tribulações e dores em que provar o amor a Deus. Necessita-se grande fidelidade.
As Sextas Moradas (11 capítulos). Consegue-se uma grande purificação interior da alma, e, entre as graças que nela se dão, totalmente sobrenaturais, estão as locuções, êxtases, etc., grande zelo pela salvação das almas, que leva a deixar a sua soledade. É necessária a contemplação da humanidade de Cristo para chegar aos últimos graus da vida mística.
As Sétimas Moradas (4 capítulos) são o cume da vida espiritual, em que se recebe a graça do matrimónio espiritual e uma íntima comunicação com a Trindade, da que brota espontaneamente uma grande paz em que vive a alma, sendo ao mesmo temo activa e contemplativa. Uma contemplação que não é subjectiva, mas que transcende o homem levando-o a esquecer-se de si e a entregar-se a Cristo e à Igreja”.
Esta espécie de resumo autorizado é como uma apresentação do Castelo no seu conjunto; e vem a ser, ao mesmo tempo, como um convite a ir verificando toda essa estrutura, não de maneira mental ou intelectual, mas vivencialmente, isto é, desde a praxis e experiência cristã, e tudo isso pela mão de Teresa de Jesus, a Doutora da Igreja Universal.  

domingo, 21 de outubro de 2012

O CASTELO INTERIOR OU AS MORADAS DE SANTA TERESA


foto tirada por Frei Salinho em Ávila 

Ordem para  escrever
         O livro das Moradas ou Castelo Interior de Santa Teresa é considerado normalmente como o melhor dela. Este livro mais que história, tem biografia, mais ainda, autobiografia. Em seu diálogo com Gracian, falando do livro da Vida, este falou à santa: “Faça memória daquilo que lembrar e de outras coisas e escreva outro livro, e diga doutrina em comum, sem nomear a pessoa que tenha experimentado”.
Esse outro livro foi o Castelo Interior. A própria autora contenta com sua obra, gosta mais desta que da outra: a Moradas sobre a Vida e em termos de joalheria, mesmo sendo para ela Vida uma joia, é mais precioso e com mais delicadas pedras preciosas o segundo (Castelo Interior), ou, como ela mesma nos diz: “A meu parecer é melhor o que escrevi depois, apesar de dizer Frei Domingos Bañez   que não é tão bom; pelo menos tinha mais experiência que quando o escrevi”.
         A ordem de escrever As Moradas veio de três lugares, do Pe. Gracian, do Doutor Velazque, e do “Vidreiro” maior: Jesus, que por outro lado era seu livro Vivo”.
As condições de saúde que estava passando a Madre eram muito penosas “com ruído e fraqueza tão grande (de cabeça) que ainda os negócios escrevo com pena”. A situação da Ordem era de perigo e Teresa estava confinada em Toledo, como uma prisão. Mas a fortaleza desta mulher faz que tenha equilíbrio para poder escrever coisas grandes. E aquela que levou  tantas fundações sem saúde e no meio de tantas contradições, vai agora construir este seu castelo com a mesma força de vontade.

Tempo de escritura, autógrafo e destinatárias

         A hora da primeira pedra e da última é ela mesma quem nos fala: “E assim começo a cumprir ( a obediência que encomendaram) hoje, dia da Santíssima Trindade ano de 1577 neste mosteiro de São José do Carmo em Toledo onde me encontro”. Isto no prólogo. Na conclusão do livro: “Acabou-se de escrever no mosteiro de São José de Ávila, ano de 1577, véspera de Santo Andre (29 de novembro), para a glória de Deus que vive e reina por sempre jamais, amém” (7M,conclusão 5)  
         Total de seis meses menos dois dias, desde que começou a escrever até o final. Um par de vezes, ao menos, fala de interrupção na escritura, “porque os negócios e a saúde me obrigam a parar” (4M 2,1) e em outro lugar dirá: “passaram quase cinco meses desde que comecei até agora, e, como a cabeça não está boa para torná-lo a ler, todo deve ir desbaratado, e por ventura falei algumas coisas duas vezes” (5M 4,1). Volta sobre o manuscrito e termina a obra em 29 de novembro.
         E uma vez concluído o livro, dá “por bem empregado o trabalho, apesar de que confesso que não foi muito”. O autógrafo das Moradas se encontra no mosteiro das carmelitas descalças de Sevilla desde outubro de 1618. Em 1622 foi levado em procissão pelas ruas de Sevilla por ocasião das festas pela canonização da autora. E a última e mais prolongada saída do manuscrito foi até Roma em 1961, onde foi restaurado pelo “Instituto Ristauro Scientifico do livro” do Vaticano e o “Instituto di Patologia do livro” de Itália. Voltou a Sevilla em 1962 e ali se conserva no convento das descalças, em um relicário bonito: as muralhas de Ávila, que se converteram em castelo para encerrar e custodiar o autógrafo do Castelo Interior. Idéia do Geral da Ordem naquela época Padre Anastásio Ballestrero.
         As destinatárias primeiras são suas monjas, como disse na “dedicatória”: “JHS. Este tratado, chamado Castelo Interior, escreveu Teresa de Jesus, monja de nossa Senhora do Carmo, a suas irmãs e filhas as monjas carmelitas descalças”.
         Destinatário da obra é também todo fiel cristão, candidato à santidade desde seu batismo.

Visita ao Castelo

         É a autora que nos vai guiando desde uma de suas confissões primeiras. Está com a pena na mão vendo como poderá começar a escrever e “se me ofereceu o que agora vou dizer para começar com algum fundamento, que é; considerar nossa alma como um castelo de um diamante ou claro cristal onde existem muitos aposentos, assim como no céu há muitas moradas (Jô 14,2; que),se bem consideramos irmãs, não é outra coisa a alma do justo senão um paraíso onde disse que tem seus deleites.” ( Prov. 8,31) (1M 1,1)
         Desde esta perspectiva, sem nenhuma complicação, entendemos qual, aliás, quem é para ela o castelo interior: a pessoa humana, e vemos como está deixando-se iluminar por esses dois textos bíblicos, de João e de Provérbios.
         Para organizar a leitura, o estudo de obra tão importante como esta, para assaltar este Castelo (se me permitem usar a frase) tem se publicado já faz tempo “um grande trabalho no qual se analisam com lupa os núcleos básicos da simbologia Teresiana, os eixo temáticos de cada uma das moradas, o itinerário léxico da interiorização, o caminho à construção simbólica da interiorização mesma” (Montserrat Esquerdo Sorte).
         Este tipo de estudo e de leitura não é fácil para a maioria dos leitores do livras das Moradas. Porém temos ao alcance das mãos uns esquemas simples, mas fácil de compreender. Nesta elaboração entram elementos doutrinais básicos, nos quais se inter-relacionam os dois protagonistas: Deus e o homem. Deus que vive e atua, e se comunica dentro. O homem (a alma) como cenário e protagonista da aventura espiritual. E a oração, que é a ponte de comunicação entre Deus e a alma. Aqui surge a ideia, o conceito de “moradas”.
         Teresa divide a obra O Castelo em sete moradas, mas ela mesma avisa: “não considerem poucas peças senão um milhão” (2M 2,12), e mais claramente: “Mesmo se tratando só de sete moradas, em cada uma delas tem mais: em baixo e alto e a os lados” (7M conclusão três).
         Prescindindo da compreensão do castelo no qual se encontram e se veem e se pode visitar e recorrer os diversos aposentos, estâncias, quartos, moradas, temos que lembrar que a alma é a que tem em si mesma as diversas ou diferentes moradas, as leva consigo, é considerada como dividida em sete moradas, sem prejuízo de que essas sete se convertam em setenta vezes sete, isto é, em inumeráveis.
         Isto fica iluminado pelo que disse nas Fundações 14, 5: “Quanto menos tenhamos aqui, mais gozaremos naquela eternidade, onde são as moradas conforme o amor com que tenhamos imitado na vida de nosso bom Jesus”. Esse além já está presente no momento em que começa a escrever: “Onde há muitos aposentos, assim como no céu existem muitas moradas” (1m 1,1). Aqui sentimos o sussurro do passo evangélico, mesmo sem mencionar: “Na casa de meu Pai tem muitas moradas” (Jó 14,2).
         O percurso pelo Castelo se torna fácil e prazeroso da mão da autora. Lendo devagar o prólogo, se deixe levar o leitor pelos títulos dos 27 capítulos que tem o livro. A Santa tem uma habilidade singular para sintetizar nesses epígrafes o que quer dizer. Mais ainda, como parece seguro, que os títulos estão escritos depois de relatado o texto, é dupla a habilidade sintetiza Dora e clarificadora da autora.     
         Terminada a leitura dos 27 títulos, ponha atenção o leitor na Conclusão, especialmente nos nº 2 e 3, onde a Madre deposita uma vez mais critérios de vida e de leitura que foi semeando ao longo do livro.
         Outro método simples para ir fixando na mente a doutrina do Castelo Interior consiste em atender à sustância bíblica que a Santa move em cada uma das moradas. Falamos sustância bíblica integrada de textos, de tipos, de personagens, de motivos bíblicos.
          Podemos ver como exemplo nas Segundas Moradas, onde encontraremos:
1. -Textos: “Quem anda no perigo nele perece” (Si 3,26); “não sabemos o que pedimos” (MT 20,22); “sem sua ajudo não podemos fazer nada” (Jô 15,5); “a paz esteja convosco” (Jô 2, 19. 21)
2.-Tipos bíblicos: o filho pródigo, perdido e comendo manjar de porcos (Luc 15,16); e os soldados de Gedeon quando iam à batalha (Ju 7, 5-7)
3.-Textos e motivos ao mesmo tempo: “Nenhum irá ao Pai senão por mim” (Jo 14,6); “quem me vê a mim vê a meu Pai” (Jo 14,19).
         Este fio condutor é fácil de seguir e mui útil ao longo de todas as moradas. Não podemos esquecer tampouco algo que ela usa muito: o mundo de seus símiles, exemplos ou comparações, que em sua pedagogia faz com que se pareça a Mestre. Um dos exemplos completos é a comparação do Castelo: 1M 1,3. Este símile não é exclusivo ( não em seu espírito e na sua pena )das Moradas já tem usado no Caminho: CV, 28, 9-12; CE 48, 1-4; em Caminho não usa a palavra “castelo”, senão “palácio”, mas a sustância é a mesma. Outro exemplo de comparação, e talvez o melhor, o do verme de seda: (5M 2, 1-10).
          O tema por assim dizer, a realidade da oração, está presente em todo o Castelo como fio condutor. A presença da oração está bem claramente exposta já em 1M 1,7: “A quanto eu posso entender, a porta para entrar neste castelo é a oração e consideração, não digo mais mental ou vocal, que sendo oração há de ser com consideração; porque aquela que não adverte com quem fala ou pede e quem é quem pede e a quem isso não é oração, mesmo que mexa muito os lábios”.
         Esta afirmação não podemos perder de vista, tendo em conta a evolução que vamos seguindo: oração rudimentar, como primeiro ensaios; meditação, simples olhar, estar na presença de Deus; recolhimento infuso, quietude, gostos; oração de união, Deus no fundo da alma; formas extáticas, visões. Alocuções, êxtases, ferida de amor; ânsias de eternidade; contemplação perfeita. Da conjunção de todos esses elementos que vamos assinalando, bem usados, irá surgindo no leitor, além do gosto mental, a compreensão da doutrina Teresiana.
         Alguém da França escreveu faz tempo, porém não era por causa da doutrina Teresiana: “A oração é o primeiro de tudo. Não é o essencial: o essencial é a caridade, que resume em si mesma a perfeição, Deus mesmo. Mas a oração é o primeiro”.
         Por isso escreveu com toda a razão José Vicente Rodriguez: “Partindo da realidade da graça e do amor, que fazem que a alma seja agradável a Deus, que seja o paraíso onde ele se deleita (1M 1,1), as moradas vão se fazendo a partir do amor, viram a ser os diversos graus de amor da alma, já que “o aproveitamento da alma não está em pensar muito, senão em amar muito” (F 5,2), e também para “subir às moradas que desejamos, não está a coisa em pensar muito, senão em amar muito” (4M 1,7). Esse amor não exclui de outras atividades, outros exercícios, e assim teremos que a alma estabelecida em amor, se empregará, v. Gr., no próprio conhecimento e no exercício da humildade, e termos as primeiras moradas (1M 2,8-9). Dar se também diversificação segundo as diferentes Mercedes recebidas de Deus (1M 1,3). Isto vemos bem claro na leitura seguida desta obra Teresiana, sendo com algo típico e fundante, v. Gr., das quartas moradas, a oração de quietude; das quintas, a oração de união; das sextas, os esponsais espiritual e das sétimas, o matrimonio espiritual”.
         Para entender plenamente como a santa leva todo seu carregamento doutrinal, se aconselha ler com toda atenção o último capitulo de todo o livro: (7M c. 4). Aqui temos a impressão que a Madre quer chegar sobre os fundamentos mais sólidos da vida cristã: o amor fraterno e a configuração com Cristo. O Castelo Interior é, sem dúvida, um manual muito bom de santidade.
         Como ajudas e pontos de referencia no recorrido do Castelo é importante e útil gravar na memória alguns pontos nos quais a Madre condensa a doutrina que vai estendendo seus tentáculos ao longo de todo o livro. Vejamos uns exemplos: Grandeza, dignidade,, capacidade, formosura da alma humana: 1M 1. Presença total, natural, sobrenatural de Deus na alma: 5M 1,10. Consciência Teresiana da diversidade de almas: 1M 1,3;5M 3,4. Fabricar cada um sua morada em Deus: 5M 2, titulo e corpo do capitulo. Ser espirituais de verdade: 7M 4,8. Não ficar anões: 7M 4,9. Ser plenamente realistas: 7M 4,14. Não colocar taxa às obras de Deus: 6M 4,12.
         E como capitulo imprescindível sobre Cristo temos que ler 6M 7, onde o titulo diz o seguinte: “disse quão grande erro é não se exercitar, por muito espirituais que sejam, em trazer presente a Humanidade de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, e sua sacratíssima Paixão e vida, e em sua gloriosa Mãe e santos. È de muito proveito”. É um capitulo paralelo com Vida 22.


Conclusão

         Em 6M 10,3 nos surpreende a Santa com a identidade e ao mesmo tempo com a diversidade que assinala neste passo: “Façamos agora conta de que é Deus como uma morada ou palácio grande e formoso, e que este palácio, como digo, é o mesmo Deus”. Tirando dessas palavras chegamos a aquilo de “sede castelos formosos como vosso Pai celestial O é”.
         O famoso catecismo holandês apresenta assim aos crentes de hoje esta obra Teresiana: “Santa Teresa escreveu um livro em que a alma está representada por um Castelo com sete moradas. Morada trás morada se chega à sétima na que habita Deus, isto é, Cristo. Sua presença se percebe em todo o Castelo, mas ao chegar a alma ao centro, imersa na própria realidade, se sente invadida ou pelo sereno sentimento de que Deus está nela. A alma vive dentro da realidade terrena, que se apresenta  magnífica diante de seus olhos, pois compreende que Deus é o coração inefável de toda realidade”.
         Na postulação para o doutorado da Santa se encontra como peça principal o Informe do advogado da causa. Para defender a altura da iminente doutrina da doutoranda se oferece um pequeno resumo das Moradas desta maneira:
         Esta “é a principal obra Teresiana, e mais, segundo alguns, de toda a mística cristã [...].O livro se divide em sete partes, ou por moradas, das quais cada uma tem vários capítulos, exceto as segundas que só tem um capitulo.
         As primeiras moradas (02 capítulos) são as almas que tem desejos de perfeição, mas estão ainda dentro das preocupações do mundo, das quais devem fugir e buscar a solidão.
         As segundas moradas (01 capítulo) são para as almas com grande determinação de viver em graça e que se dedicam à oração e alguma mortificação, ainda com muitas tentações por não deixar totalmente o mundo.
         As terceiras moradas (02 capítulos) são para as almas que exercitam a virtude e a oração, mas colocando um disfarçado amor de si mesmos. Precisam de humildade e obediência.
         As quartas moradas (03 capítulos) são já o começo das coisas “sobrenaturais”: a oração de quietude e um inicio da união. Os frutos não são ainda estáveis; as almas devem por isso tem que fugir do mundo e das ocasiões.
         As quintas moradas (04 capítulos) são já de plena vida mística, com a oração de união que é sobrenatural e a de Deus quando quer e como quer, apesar de que a alma pode se preparar. Os sinais verdadeiros de esta união é que seja total, que não falte a certeza da presença de Deus e que sucedam tribulações e dores em que provar o amor a Deus. Necessita se de muita fidelidade.
         As sextas moradas (11 capítulos). Logra se uma grande purificação interior da alma, e entre as graças que nela se dão, totalmente sobrenaturais, estão as alocuções, êxtases, etc., Grande zelo pela salvação das almas, que leva a desejar sua solidão. É necessária a contemplação da Humanidade de Cristo para chegar aos últimos graus da vida mística.
         As sétimas moradas (04 capítulos) são o cume da vida espiritual, na que se recebe a graça do matrimonio espiritual e uma intima comunicação com a Trindade, da qual brota espontaneamente uma grande paz na que vive a alma, sendo ativa e contemplativa ao mesmo tempo. “Uma contemplação que não é subjetiva, senão que transcende ao homem fazendo que se esqueça de si mesmo e assim entregar-se a Cristo e à Igreja”.
         Esta espécie de resumo autorizado é como a apresentação do castelo em seu conjunto; e é ao mesmo tempo um convite para ir verificando toda essa estrutura, não de uma maneira mental ou intelectual senão vivencialmente, isto é, desde a práxis e experiência cristã e tudo  isso levados da mão de Teresa de Jesus doutora da igreja.
Tradução : Frei Francisco Xavier Yudego Marin, ocd

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